Arquivo do mês: agosto 2017

Liberdade de expressão dos policiais e bombeiros militares – Júlio César Lopes da Silva

INTRODUÇÃO[1]

No início do exercício profissional na caserna do Corpo de Bombeiros Militar do Estado de Mato Grosso no ano de 2004, teve-se a oportunidade de presenciar as péssimas condições de trabalho, a insuficiência de qualificação técnico-profissional, além de diversas práticas abusivas cometidas pelos superiores contra os servidores de baixa patente.

Tais circunstâncias geram, obviamente, insatisfação e desmotivação nestes servidores, que repercuti diretamente na qualidade da prestação do serviço de segurança pública à sociedade que, por sua vez, deixa de confiar ou valorizar a instituição, fazendo perpetuar o insucesso da segurança pública.

Foi observado, no entanto, que mesmo diante dos problemas e dos abusos, os militares de baixa patente se quedavam inertes e calados por medo de perseguições e mais abuso que vem revestido de uma fictícia legalidade, visto que o Regulamento Disciplinar Militar do Estado de Mato Grosso, Decreto nº 1239, de 21 de abril de 1978, prevê pena de até 30 (trinta) dias de prisão ao militar que criticar ato do governo ou de superior hierárquico ou por recorrer ao judiciário sem antes esgotar a esfera administrativa, pois nunca, dentro da caserna matogrossense, se discutiu a vigência de tal Regulamento Disciplinar que sequer foi recepcionado pela nova ordem constitucional.

Assim, este trabalho visa demonstrar a ilegalidade das normas militares cerceadoras da livre manifestação do pensamento, como afronta à dignidade da pessoa humana do profissional da segurança pública, motivo pelo qual se propõe a criação de políticas públicas para efetivamente garantir o exercício de tal direito, a fim de possibilitar que temas como a discriminação, corrupção, abusos e as demais dificuldades da segurança pública venham à tona para propiciar a plena discussão dos temas relacionados à segurança pública, criando um  ambiente apto para a mudança e melhoria da segurança no Brasil.

Com efeito, há várias regras do Regulamento Disciplinar Militar e do Código Penal Militar que não foram recepcionadas pela nova ordem constitucional, porém o presente trabalho concentrar-se-á apenas no cerne para a solução dos problemas da segurança pública, que é o discurso democrático, a criação, a livre manifestação do pensamento.

A livre manifestação do pensamento é o pilar principal no qual se sustenta a democracia, já que esta se pauta no debate livre à procura da melhor tomada de decisão para o bem comum da sociedade. Não há democracia nem Estado Democrático de Direito sem a livre manifestação do pensamento, motivo pelo qual o seu cerceamento leva ao autoritarismo e ao descontrole da atividade governamental.

A liberdade de expressão é definida como direito natural, decorrente da própria natureza humana, sendo, portanto, um direito fundamental, intransferível e inerente ao direito da personalidade e à dignidade da pessoa humana. É um direito individual com repercussão nos direitos coletivos e difusos, visto que o Estado Democrático de Direito depende de cidadãos informados, conscientes e politizados aptos a tomar decisões para a melhoria da coletividade. Nesse sentido, o Ministro do Supremo Tribunal de Federal, Marco Aurélio[2], sintetiza que a Liberdade de Expressão é um direito fundamental do cidadão, envolvendo o pensamento, a exposição de fatos atuais ou históricos e a crítica.

A Declaração de Direitos humanos e do Cidadão, de 1789, em seu artigo 11 dispõe que a livre a manifestação do pensamento e das opiniões é um dos direitos mais preciosos do homem.

Pontes de Miranda[3] pondera que liberdade psíquica é a base para toda e qualquer liberdade, abrangendo tudo que serve para enunciar e dar sentido, incluindo a liberdade de manifestar para com as demais pessoas ou enquanto ao homem consigo mesmo.

Norberto Bobbio[4], em obra o futuro da Democracia, define democracia como “um conjunto de regras de procedimento para a formação de decisões coletivas em que está prevista e facilitada a participação mais ampla possível dos interessados” e Edilson Faria[5] ensina brilhantemente que democracia e censura são termos antitéticos, antagônicos, inconciliáveis.

Com efeito, a livre circulação de opiniões e pluralismo ideológico faz oposição ao monopólio governamental. Assim, ao se vedar ou limitar o direito à liberdade de expressão, institui-se um sistema antidemocrático e autocrata.

Nesta seara, democracia versus censura, Pinto Ferreira[6], leciona que no Estado Democrático, defende-se, no aspecto positivo, a livre manifestação do pensamento e, sob o aspecto negativo, veda-se qualquer tipo de censura, impedindo que a liberdade de expressão sofra algum tipo de limitação prévia concernentes à censura de natureza política, ideológica ou artística.

Desmond Fischer[7] afirma que a evolução gradual da democracia faz um paralelo com desmistificação do processo de comunicação e a conseqüente disseminação da informação e dos meios de comunicá-la, pois quanto mais pessoas tiverem informações, melhor será a sociedade e mais forte sua base democrática, pois o direito de comunicar-se ultrapassa o conceito legal e alcança o conceito filosófico e ético, já que é no nível político, sócio-culturais, econômicas e legais do direito de comunicar se tornam mais significativos, devendo, portanto, garantir esse direito em sua plenitude.

A manifestação do pensamento, para Aluizio Ferreira[8] É pressuposto para uma convivência democrática plena, uma vez que necessita de discussão, negociação, oposições e embates de idéias, pois estas são instrumentos de que se valem para firmar suas convicções, persuadindo ou convencendo os respectivos pares e obtendo unanimidades ou consensos.

Todavia, durante o período militar (1964-1985), viveu-se sob uma política governamental autoritária e antidemocrática, movida pela censura e pela manipulação das informações pelo Estado. A liberdade de expressão da sociedade, civil ou mesmo militar, era controlada pela alta cúpula do governo que buscava, independentemente de quaisquer meios ou força, perpetuar-se no poder.

Muita coisa mudou com o fim do governo militar, mas ainda restam resquícios daquele período funesto. A diminuição da censura com advento da promulgação da Constituição da República foi um significativo avanço político, social, cultural e científico ao país, no entanto a censura continua existindo em vários setores da sociedade, com destaque especial às instituições da segurança pública, principalmente as militares, já que nestas instituições vive-se um verdadeiro período de “cala a boca”, propiciada pela aplicação de algumas normas que não foram sequer recepcionadas pelo novo ordenamento jurídico.

Nesse sentido, continuam sendo ilegalmente aplicados, especificadamente ao que concerne à liberdade de expressão, o artigo 166 do Decreto-Lei nº 1.001, de 21 de outubro de 1969 e outras normas, com o mesmo fim, dispostas nos Regulamentos Disciplinares Militares das Polícias Militares.

Tais institutos, cerceadores da liberdade de expressão, devem ser imediatamente expurgos do nosso ordenamento jurídico, pois somente à Constituição cabe a regulação da liberdade de expressão nos termos do artigo 220, o qual se transcreve com destaques:

“Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.”

Assim, todo e qualquer tipo de censura ou cerceamento à liberdade de expressão disposta em lei é inconstitucional, visto que cabe somente à Constituição Federal tal regulação, como se demonstrará neste trabalho.

A alternativa encontrada pelos servidores da segurança pública, principalmente os militares, foi recorrer à tecnologia da internet, fazendo uso dos blogs como meio para manifestação do pensamento e discussão pela melhoria da prestação dos serviços de segurança à sociedade, bem como pela busca incessante por valorização profissional e otimização das condições de trabalho do policial.

1. CERCEAMENTO DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO DOS MILITARES

Constantemente têm-se notícias de que militares foram punidos com prisão por se manifestarem publicamente, ora por criticar ato de governo ou de superior hierárquico ora por fazer reivindicações por melhoria da condição de trabalho.

Com advento do acidente do Boeing 737-800 da companhia Gol com Jato Legaci, no qual morreram 154 (cento e cinqüenta e quatro) pessoas, veio à tona a discussão da liberdade de expressão dos militares e a importância desta manifestação à sociedade.

Em uma entrevista à Folha on line em 17 de abril de 2007[9], na qual se discutia o acidente da Companhia Gol, o presidente da Associação Brasileira de Controladores de Tráfego Aéreo, Wellington Rodrigues, afirmou que na região onde aconteceu o acidente havia um “buraco negro”, uma “zona cega” onde não se tinha visualização por radar e que as informações e problemas eram repassados ao grau superior diariamente, porém nada ou quase nada foi feito para melhorar a segurança do tráfico aéreo no Brasil.

Em 30 de Março de 2007 o Estadão[10] noticiou que o Sargento da aeronáutica, Jonas Teixeira Junior, havia sido preso sob a alegação de insubordinação por registrar, no livro de ocorrências oficial, irregularidades e deficiências que podiam comprometer a segurança de vôo em Salvador, procedimento este que havia sido proibido pelo comando do Cindacta local.

Ora, há quantas décadas o problema na segurança aérea já existe? Era realmente necessária a morte de centenas de vítimas para se cogitar uma mudança ou pelo menos para se discutir o problema?

Infelizmente não, mas a censura estatal sob a égide da “hierarquia e disciplina” levou aqueles passageiros à morte. O que se busca com esse exemplo de repercussão nacional é demonstrar a incoerência das normas militares que punem injustamente a liberdade de expressão.

Assim, as normas militares que cerceam a liberdade de expressão não poderiam encontrar abrigo no atual Estado Democrático de Direito, mas que devido ao abuso de poder dos superiores hierárquicos, bem como a não declaração de que tais normas militares contrariam a Constituição, permitem que os abusos se perpetuem com eficácia no nosso ordenamento jurídico.

Com efeito, os regulamentos disciplinares das Polícias Militares e das Forças Armadas, bem como o Código Penal Militar proíbem a liberdade de expressão dos militares, cominando penas restritivas de liberdade que podem chegar a um ano.

Neste sentido estabelece o artigo 166 do Decreto-Lei nº 1.001, de 21 de outubro de 1969. Transcreve-se o tipo legal:

Publicar o militar ou assemelhado, sem licença, ato ou documento oficial, ou criticar públicamente ato de seu superior ou assunto atinente à disciplina militar, ou a qualquer resolução do Govêrno: 

Pena – detenção, de dois meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave.”

Loureiro Neto[11], em análise do referido tipo penal, aduz que publicar significa tornar público, notório, enquanto criticar significa censurar, dizer mau. Assim configuraria crime a conduta de criticar publicamente, de modo a ser recebido por indeterminado número de pessoas, ato de seu superior ou assunto atinente à disciplina militar, ou a qualquer resolução do governo.

Os regulamentos disciplinares também estabelecem penas de prisão de até 30 (trinta) dias ao militar que manifeste seu pensamento. Remete-se à norma disposta no item 70 e 101 do anexo II do Decreto 1329 de 1978 (Regulamento Disciplinar da Polícia Militar do Estado de Mato Grosso), o qual semelhantemente é repetido na maioria dos Regulamentos Disciplinares no Brasil. In Verbis:

“70 – Publicar ou contribuir para que sejam publicados fatos, documentos ou assuntos policiais-militares que possam concorrer para o desprestígio da Corporação ou firam a disciplina ou a segurança”. (item 70 do anexo II do RDPM-MT) (…)

“101 – Discutir ou provocar discussões, por qualquer veículo de comunicação, sobre assuntos políticos, militares ou policiais-militares, excetuando-se os de natureza exclusivamente técnicos, quando devidamente autorizado” (item 101 do anexo II do RDPM-MT)

O Código Penal Militar de 1969 e a maioria dos regulamentos disciplinares militares das polícias estaduais são frutos de um Estado Autoritário, que por mais de décadas cerceou as liberdades fundamentais com fito à proteção a esse mesmo regime, visto que todos eles foram criados com este propósito.

Tais institutos cerceam a liberdade de expressão dos cidadãos militares, afrontando diretamente o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, limitando o direito pleno à vida dos militares e prejudicando a sociedade que somente tem acesso a parte das informações. Informações estas no mínimo manipuladas pelo Estado Militar, que sob a desculpa da “segurança nacional” da hierarquia, disciplina, vem prendendo os militares que ousam exercer o seu direito de liberdade de expressão.

Ao considerar como crime ou transgressão o exercício da liberdade de expressão, retrocede-se ao período inquisitorial, ou pelo menos impedimos que se alcance a democracia plena e de fato.

O Código Penal Militar como os Regulamentos Disciplinares remontam ao período nefasto da ditadura, quase todos criados entre a década de 60 e 80, período cujos objetivos dos governantes eram manter-se a qualquer custo no poder, mesmo que este custo fosse a censura, um cala-boca, aos “anti-governo”.

Toda norma legal tem como escopo a pacificação social o que nos obriga a reconhecer como crime apenas as condutas perniciosas à sociedade, ou seja, somente as condutas que exponham real perigo para coletividade devem ser reprimidas por leis penais que não é o caso da manifestação do pensamento.

A norma penal em um Estado Democrático de Direito exige mais do que a mera tipificação em lei, pois tal requisito isoladamente é inidôneo para cecear as liberdades fundamentais, devendo a conduta, além de estar tipificada, ofender o sentimento social de justiça, bem como estar a norma consubstanciada nos princípios constitucionais, não se admitindo critérios absolutos na definição dos crimes, os quais passam a ter a exigência de ordem formal e material.

A exigência formal, requisitada pelo o inciso II do artigo 5º da Constituição Federal, a qual assevera que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei, deve ser interpretada em conjunto com o princípio da dignidade da pessoa humana, exigência material.

Neste sentido, o professor Fernando Capez[12] leciona que a norma penal no Brasil de hoje deve estar em compatibilidade formal e material com mandamentos constitucionais, sob pena de afrontar o próprio Estado Democrático de Direito:

Com isso, pode-se afirmar que a norma penal em um Estado Democrático de Direito não é apenas aquela que formalmente descreve um fato como infração penal, pouco importando se ele ofende ou não o sentimento social de justiça; ao contrário sob pena de colidir com a Constituição, o tipo incriminador deverá obrigatoriamente selecionar, dentre todos os comportamentos humanos, aqueles que possuem de fato real lesividade social.

Sendo a norma penal, princípio básico de República Federativa do Brasil, constituída em Estado Democrático de Direito (CF, art. 1º III) uma lei como essa característica de mera discriminação formal será irremediavelmente inconstitucional.

Assim, o tipo penal ou a sua aplicação, quando, a pretexto de cumprir uma função de controle social, desvincula-se totalmente da realidade, sem dar importância à existência de algum efetivo dano ou lesão social, padecerá irremediavelmente do vício de incompatibilidade vertical com o princípio constitucional de dignidade humana.”

Com efeito, o fato de a conduta de “criticar publicamente ato de seu superior ou assunto atinente à disciplina militar, ou a qualquer resolução do Governo” estar tipificado como crime punível com prisão em um Código Penal Militar não faz com que tal conduta seja criminosa, visto não trazer lesividade à sociedade, muito pelo contrário, apenas pode-se dizer que vivemos em um Estado Democrático de Direito se tivermos plena liberdade de expressão, limitada apenas por valores constitucionais, onde a crítica, a informação, a comunicação,  estejam ao acesso de todos.

Nesta seara continua Fernando Capez:

É imperativo do Estado Democrático de Direito a investigação ontológica do tipo incriminador. Crime não é apenas aquilo que o legislador diz sê-lo (conceito formal),  uma vez que nenhuma conduta pode, materialmente, ser considerada criminosa se, de algum modo, não colocar em perigo valores fundamentais da sociedade.

Imaginemos um tipo com a seguinte descrição: ‘manifestar ponto de vista contrário ao político dominante ou opinião contrária a orientação política dominante. Pena: 6 meses a 1 ano de detenção.’

Por evidente, a par de estarem sendo obedecidas as garantias de existência de subsunção formal e de veiculação em lei, materialmente esse tipo não teria qualquer subsistência por ferir o princípio da dignidade humana e, por conseguinte, não resistir ao controle de compatibilidade vertical com os princípios insertos da ordem constitucional.”

Nesse mesmo sentido, Loureiro Neto[13] ensina que o objeto do Direito Penal, seja o comum como o militar, é a proteção dos bens ou interesses juridicamente relevantes, devendo valorá-los de acordo com o contexto histórico e as concepções ético-políticas dominantes.

Assim, taxar como crime a liberdade de expressão não faz com que tal conduta seja criminosa, visto que materialmente a liberdade de expressão se trata de uma conduta defendida e protegida pela própria Carta Magna Brasileira. Além disso, observa-se, que a Constituição não faz distinção entre cidadãos civis e militares, negros ou brancos, pobres ou ricos, pois a todos é garantindo a manifestação do pensamento, limitando tal direito apenas à norma constitucional.

Ademais, ao censurar as opiniões e a expressão dos militares, seja eles de quaisquer patentes, impomos no país uma limitação de soluções para segurança pública, impedindo as mudanças desejadas, pois, infelizmente, alguns servidores beneficiam-se do caos na segurança pública, e estes não almejam transformações.

Assim, ao não permitir a expressão das opiniões dos militares, monopoliza-se as informações aos dogmas estatais ou aos interesses de certos comandantes, os quais nem sempre são os condizentes à proteção da pátria, já que se tornou comum o uso da máquina pública em benefício dos detentores do poder.

Não se pode negar que os atuais políticos diante de “problemas”, principalmente na segurança pública, tentam ocultá-los ao invés de resolvê-los, muitas vezes, falseando dados e informações. Por isso os servidores da segurança pública deveriam divulgar a real situação de tais órgãos e serviços para que a solução fosse dada o mais rápido possível, por meio do próprio Governo do Estado ou por Intervenção Federal.

É inegável que um soldado, executor direto e detentor de conhecimentos específicos na área de segurança pública, ao ser ouvido, poderá contribuir para a melhoria dos serviços de proteção do homem. Agora, puni-lo por divulgar seu pensamento na intenção de tentar melhorar a condição da segurança pública é no mínimo ilógico e nefasto, além de ofender o Estado Democrático de Direito.

Assim, a proibição a manifestação do pensamento pelos militares, atenta axiológica e teleologicamente contra os princípios que preconizam o interesse da coletividade, já que os militares, por experiência e contato direto com o sistema de segurança, conhecem os pormenores e as necessidades para redução da criminalidade. Ao se calarem diminuem a possibilidade de avanços significativos no aparelho de segurança pública, já que informações importantes deixarão de serem veiculadas, restringindo idéias que levariam a sociedade à discussão e a vicissitudes que trariam mudanças na melhoria da segurança.

Ao proibir as críticas aos atos dos superiores e ao governo, mascara-se a real situação da segurança pública, já que a sociedade obtém apenas às informações “oficiais” as quais são repassadas em proveito do próprio agente da administração pública, uma vez que ninguém é capaz de assinar e divulgar sua própria incompetência ou a inabililidade daquele que o nomeou ou o colocou no poder.

Destarte, estas informações oficiais visam apenas demonstrar que os governantes e os detentores do poder estão tomando as melhores decisões para a efetiva e beníguina mudança na situação da segurança no país, quando realmente a verdade real está longe daquilo que foi dito e que se conhece.

Neste sentido, é inadmissível e criminosa a ocultação ou censura de informações relevantes à diminuição da criminalidade no Brasil e, por isso, é impróprio permitir que se lance informações inverídicas ou maquiadas em benefício de alguns, pois ao esconder as verdades, calando ou fazendo calar, aflora-se a conivência para com a criminalidade, o que faz perpetuar o insucesso da prestação do serviço de segurança pública à sociedade, pois somente através do vislumbramento da realidade tem-se condição efetiva de mudar este quadro.

Deve-se, ao contrário do que acontece, criar incentivos para que os militares se expressem, denunciando as mazelas, os abusos, as corrupções e crimes, mesmo que advenha de dentro da sua própria instituição, criando e fomentando políticas públicas para a constante discussão do tema, inclusive, criando programas efetivos de proteção aos servidores honestos que denunciam os crimes cometidos pelos próprios operadores da segurança pública.

2. PROTEÇÃO LEGAL AO DIREITO À LIBERDADE DE EXPRESSÃO

O cerceamento à livre manifestação do pensamento, atenta contra todo ordenamento jurídico brasileiro, principalmente, contra a Constituição Federal e aos vários Tratados Internacionais, incidindo para que o atual Estado Democrático de Direito estabelecido no país regrida aos tempos da ditadura militar.

Com efeito, a Constituição Federal estabelece que é livre a manifestação do pensamento, a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença e, ainda, garante que a manifestação do pensamento não sofrerá qualquer restrição.  Destaca-se os incisos IV e IX do artigo 5º e o artigo 220 os quais transcrevo:

Art. 5º (…)

IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;

IX – é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;

Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

§ 1º – Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.

§ 2º – É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.”

Ademais, quanto à Administração Pública, informar deixa de ser um direito e passa a ser um dever, é o caso da publicidade obrigatória dos atos praticados pela Administração pública, imposta pelo artigo 37 da Constituição Federal.

O princípio da publicidade apresenta dupla acepção.  Refere-se o princípio à publicação oficial dos atos da Administração Pública como pressuposto de sua eficácia, impedindo que o ato produza efeitos e a outra acepção concerne à transparência e à moralidade, visto que é inaceitável a existência de atos sigilosos ou confidenciais que pretendam criar, restringir ou extinguir direitos. Tão verdadeira essa assertiva que a Constituição garante que todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade nos termos do artigo 5º, inciso XXXII.  Neste sentido se manifestou o eminente Ministro do STF, Carlos Ayres Brito[14]:

“Mais ainda, visibilidade que, tendo por núcleo o proceder da Administração Pública, toma a designação de “publicidade” (art. 37, caput, da CF). Publicidade como transparência, anote-se, de logo alçada à dimensão de “princípio”, ao lado da “legalidade”, “impessoalidade”, “moralidade” e “eficiência”. Sendo certo que a publicidade que se eleva à dimensão de verdadeira transparência é o mais aplainado caminho para a fiel aplicação da lei e dos outros três princípios da moralidade, da eficiência e da impessoalidade na Administração Pública.”

No mesmo voto,15 o ministro relator enfatiza a garantia dada pela constituição à liberdade de expressão:

“Com efeito, e a título de outorga de um direito individual que o ritmo de civilização do Brasil impôs como conatural à espécie humana (pois sem ele o indivíduo como que se fragmenta em sua incomparável dignidade e assim deixa de ser o ápice da escala animal para se reduzir a subespécie), a Constituição proclama que ”é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato” (inciso IV do art. 5º). Assim também, e de novo como pauta de direitos mais fortemente entroncados com a dignidade da pessoa humana, a nossa Lei Maior estabelece nesse mesmo art. 5º que: a) “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença” (inciso IX); b) “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer” (inciso XIII); c) ”é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional” (inciso XIV); d) “conceder-se-á habeas data: a) para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público: b)  para a retificação de dados, quando não prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo” (inciso LXXII)”.

A livre manifestação do pensamento, também, é tutelada pelos Tratados Internacionais celebrados pelo governo brasileiro, os quais garantem a todos o direito amplo de se comunicar, sobre quaisquer assuntos nos limites impostos pela própria Constituição.

Nesta seara, pode-se destacar o preâmbulo e o artigo XIX da Declaração Universal dos Direitos Humanos, celebrado e ratificado pelo Brasil, que dispõe:

Considerando que o desprezo e o desrespeito pelos direitos humanos resultaram em atos bárbaros que ultrajaram a consciência da Humanidade e que o advento de liberdade de palavra, de crença e da liberdade de viverem a salvo do temor e da necessidade foi proclamado como a mais alta aspiração do ser humano comum,” (…)

“Todo o homem tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferências, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios, independentemente de fronteiras“.  (sem destaque na fonte)

O Brasil e outros países latino-americanos assinaram em 1996 e posteriormente em 29 de maio de 2006 a Declaração Internacional de Chapultepec  no intuito de consagrar a liberdade de expressão e de imprensa. A declaração estabelece que:

“I- Não há pessoas nem sociedades livres sem liberdade de expressão e de imprensa. O exercício dessa não é uma concessão das autoridades, é um direito inalienável do povo. II – Toda pessoa tem o direito de buscar e receber informação, expressar opiniões e divulgá-las livremente. Ninguém pode restringir ou negar esses direitos.

Ainda há o Pacto de São José da Costa Rica, a Declaração Americana Sobre Direitos Humanos, aprovada pelo Congresso Nacional e ratificada pelo presidente da República por meio do Decreto 678/92, de 6-11-92[15] que dispõe que em seu artigo XIII:

“Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito compreende a liberdade de buscar, receber e difundir informações e idéias de toda natureza, sem consideração de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro processo de sua escolha. Não se pode restringir o direito de expressão por vias ou meios indiretos, tais como o abuso de controles oficiais ou particulares de papel de imprensa, de freqüências radioelétricas ou de equipamentos e aparelhos usados na difusão de informação, nem por quaisquer outros meios destinados a obstar a comunicação e a circulação de idéias e opiniões”.

Enfim, Constituição Federal e os Tratados Internacionais mencionados, garantem de forma ampla, geral e irrestrita, aos civis ou militares, a liberdade de expressão, proibindo qualquer forma de registro, licença ou censura.

José Afonso da Silva[16] ensina que direito de liberdade de expressão e comunicação obedecem aos seguintes princípios:

a) Não sofrerão qualquer restrição independentemente do meio ou veículo de comunicação, observado o disposto na Constituição;

b) Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística;

c) É vedada toda e qualquer forma de censura de natureza política, ideológica e artística;

d) A publicação de veículo impresso de comunicação independe de licença de autoridade;

e) Os serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens dependem de autorização, concessão ou permissão do Poder Executivo Federal, sob controle do Congresso Nacional;

f) Os meios de comunicação não podem ser objeto de monopólio.

Porém, mesmo com o advento de toda tutela jurídica em proteção à manifestação do pensamento, os militares encontram-se tolhidos de se expressar.

3. MANIFESTAÇÃO DO STF QUANTO À LIBERDADE DE EXPRESSÃO DOS MILITARES

Em maio de 1998, o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou habeas corpus nº 75.676 – RJ no qual figurou como paciente um militar da reserva que fora acusado de crime de publicação ou crítica indevida (artigo 166 do CPM) por ter concedido uma entrevista à rede rádio CBN, na qual criticou publicamente ato do Comandante Geral da PMRJ, o governo do Estado, os cursos de formação profissional ministrados aos policiais e à política de segurança pública. Transcrevo as palavras tidas como criminosas:

“… esses policiais que estão indo pro confronto estão completamente despreparados, eles não fazem treinamento de tiros há anos. Eles não são avaliados nas suas condições profissionais, nas suas condições emocionais”. (…)

“E como a Secretaria de Segurança não faz o que deve ser feito, o Governo não faz aquilo que tem obrigação de fazer, lança mão dessas soluções mágicas, entende?(…)

Porque, na verdade, no Rio de Janeiro se reinstalaram o DOI-CODI, mas só para favelado e morador de bairro pobre”.

O eminente Ministro relator Sepúlveda Pertence aduziu ao parecer do Dr Edson de Almeida, pela procuradoria-Geral, para ratificar a concessão do habeas Corpus. Nesse parecer asseverou-se que as Polícias Militares são apenas corporações militarizadas, cuja função é de policiamento ostensivo e de preservação da ordem pública, função esta eminentemente civil. Ainda acrescentou que as proibições do artigo 166 do CPM são censuras. Transcreve-se:

Ora, ao contrário do que ocorre com as Forças Armada, que são instituições militares pela sua própria natureza, as Polícias Militares, cuja função de policiamento ostensivo e de preservação da ordem pública é eminentemente civil, são apenas corporações militarizadas mas, nem por isso, assumem, contra a natureza das coisas, status de instituições militares”(…)

“Em verdade, submeter o policial militar da reserva ou reformado às proibições do artigo 166 do Código Penal Militar, sequer se cogitando de manifestações ofensivas, representa clara limitação à livre manifestação do pensamento e estabelecimento de uma forma de censura” (CF art. 5, IV e IX)

Foi discutida, também, a manifestação do pensamento por militar no Habeas Corpus 83.125-7 julgado em 16/09/2003, cujo relator foi expressivo Ministro Marco Aurélio. Nesse Habeas Corpus, buscava a concessão para extirpar o crime tipificado no artigo 219 do CPM o qual considera crime propalar fatos, que sabe inverídicos, capazes de ofender a dignidade ou abalar o crédito das forças armadas ou a confiança que estas merecem do público (artigo 219 do CPM).

Nesse caso, o paciente havia publicado livro intitulado “Feridas da Ditadura Militar” abordando temas, tidos como ofensivo ao Exercito, tais como desapropriação realizada pela União de terras pertencentes a pequenos agricultores no município de Formosa, Estado de Goiás, destinado toda sua extensão para o inadequado uso militar; torturas praticadas durante o período militar e sobre a guerrilha do Araguaia.

O ministro relator iniciou seu voto afirmando que não há Estado Democrático de Direito sem observância da liberdade de expressão, estando garantido tal direito fundamental no artigo 5º da Constituição Federal. Acrescenta que o artigo 220 da Constituição Federal preceitua que a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado os limites impostos pela mesma Constituição.

Ainda neste julgado o Ministro Marco Aurélio destaca parecer da Procuradoria Geral da República, o qual se faz importante transcrever:

“Não há absolutamente nada na denúncia que demonstre, de forma inequívoca, que os fatos propalados pelo recorrido sejam inverídicos, falsos, mentirosos, caluniosos, muito menos que ele tivesse plena consciência disso. Aliais seria verdadeiramente aberrante tachar de inverdade uma tela tão triste da nossa história recente como o da repressão e da tortura, nem se podendo, em nome da proteção da honra e da intimidade, restringir a livre manifestação do pensamento quando se trata da discussão e crítica de arbitrariedades patrocinadas ou consentidas pelo Poder Público…”

Em análise de liminar referendada pelo Tribunal Pleno do STF, da ação arguição de descumprimento de preceito fundamental nº 130[17], o eminente Ministro Carlos Brito consignou que a referida lei de imprensa não mais se enquadra aos padrões da Democracia, visto que a liberdade de expressão deve se obstar apenas aos preceitos dispostos na Constituição, motivo pelo qual se suspendeu os efeitos da Lei de imprensa até o julgamento de mérito que acabou por declarar tal lei incompatível com a Constituição Federal. Vejamos trecho da decisão em liminar:

“Em que pese a ressalva do relator quanto à multifuncionalidade da ADPF e seu caráter subsidiário, há reiterados pronunciamentos do Supremo Tribunal Federal pela aplicabilidade do instituto. Princípio constitucional de maior densidade axiológica e mais elevada estatura sistêmica, a Democracia avulta como síntese dos fundamentos da República Federativa brasileira. Democracia que, segundo a Constituição Federal, se apóia em dois dos mais vistosos pilares: a) o da informação em plenitude e de máxima qualidade; b) o da transparência ou visibilidade do Poder, seja ele político, seja econômico, seja religioso (art. 220 da CF/88).

A Lei n. 5.250/67 não parece serviente do padrão de Democracia e de Imprensa que ressaiu das pranchetas da Assembléia Constituinte de 87/88. Entretanto, a suspensão total de sua eficácia acarreta prejuízos à própria liberdade de imprensa. Necessidade, portanto, de leitura individualizada de todos os dispositivos da Lei n. 5.250/67. Procedimento, contudo, que a prudência impõe seja realizado quando do julgamento de mérito da ADPF.

Verificação, desde logo, de descompasso entre a Carta de 1988 e os seguintes dispositivos da Lei de Imprensa, a evidenciar a necessidade de concessão da cautelar requerida (…)”

4. RELATIVIZAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

É verdadeira a assertiva de que não há nenhum direito absoluto, por mais fundamental que seja, já que todo direito tem como correspondente um dever. Nem o direito a vida se coloca absoluto, já que este direito é relativizado quando se admite a pena de morte nos casos de guerra declarada.

Os direitos concernentes à livre manifestação do pensamento, conforme afirma Luis Gustavo G.C de Carvalho[18], são de eficácia plena, não admitindo qualquer tipo de contenção por lei ordinária a não ser meramente confirmativa das restrições que a própria constituição menciona nos incisos do artigo 5º. Assim se há limites à liberdade de informação eles decorrem necessariamente da Constituição que são o direito à intimidade, direito à imagem, direito à honra e os valores éticos sociais.

Assim, por exemplo, a declaração do direito de liberdade de expressão, taxado no inciso IV do artigo 5º da CF, está limitado no mesmo corpo do dispositivo, pois se declara um direito “é livre a manifestação do pensamento” e logo em seguida se exige um dever “vedado o anonimato”,  ou, ainda, garante-se um direito “é livre a manifestação do pensamento” e em seguida se impõe uma responsabilidade para quem abusa deste direito “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação[19]”.

Ademais, como expõe Sylvio Motta[20], que os direitos individuais têm hierarquia constitucional e, por conseguinte, só podem ser limitados por expressa autorização legal com fundamento na própria constituição. Assim, os direitos fundamentais ou são limitados pela própria constituição ou por lei criada por determinação constitucional.

No caso dos direitos de liberdade de expressão, incluído, a manifestação do pensamento, a atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, a relativização é permitida apenas através da própria constituição.

A exemplo, pode-se destacar o artigo 220 da CF que assevera “A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição”.

Observe que o texto constitucional é incisivo “nos termos desta constituição”, não dando margem à relativização do deito a liberdade de expressão por via de lei infraconstitucional. Assim, apenas a Constituição Federal está autorizada a relativizar o direito a liberdade de expressão.

Ademais, os direitos fundamentais têm garantida a aplicabilidade imediata, conforme parágrafo primeiros do artigo 5º da CF[21], não precisando de lei para torna efetivo tal exercício, com exceção dos direitos fundamentais em que a própria constituição exige regulamentação por lei. Nestes casos, chamados de normas de eficácia contida, a constituição faz referência à expressão “na forma da lei”.

Não é caso dos direitos concernentes à liberdade de expressão, que além de ter sua aplicação imediata, só podem ser limitados pelas normas expressas no texto constitucional.

Neste mesmo sentido já se manifestou o Supremo Tribunal Federal:

“Liberdade de expressão. Garantia constitucional que não se tem como absoluta. Limites morais e jurídicos. O direito à livre expressão não pode abrigar, em sua abrangência, manifestações de conteúdo imoral que implicam ilicitude penal. As liberdades públicas não são incondicionais, por isso devem ser exercidas de maneira harmônica, observados os limites definidos na própria Constituição Federal (CF, artigo 5º, § 2º, primeira parte). O preceito fundamental de liberdade de expressão não consagra o ‘direito à incitação ao racismo’, dado que um direito individual não pode constituir-se em salvaguarda de condutas ilícitas, como sucede com os delitos contra a honra. Prevalência dos princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade jurídica.”[22]

É obvio que a liberdade de expressão é inerente ao ser humano, fazendo parte do direito à vida em lato senso, porém é não absoluto e encontra limites dentro da própria Constituição Federal a fim de proteger outros direitos fundamentais. Nesse sentido transcreve-se trecho do voto do ministro Carlos Brito exarado na ação de ADPF 130:

“É de se perguntar, naturalmente: mas a que disposições constitucionais se refere o precitado art. 220 como de obrigatória observância no desfrute das liberdades de pensamento, criação, expressão e informação que, de alguma forma, se veiculem pela imprensa? Resposta: àquelas disposições do art. 5º, versantes sobre vedação do anonimato (parte final do inciso IV); direito de resposta (inciso V); direito a indenização por dano material ou moral à intimidade, à vida privada, à honra e imagem das pessoas (inciso X); livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer (inciso XIII); direito ao resguardo do sigilo da fonte de informação, quando necessário ao exercício profissional (inciso XIV)”.

Portanto, é livre a manifestação do pensamento desde que identificável o seu autor[23], pois ao autor deve recair os efeitos da expressão do próprio pensamento, recebendo os devidos créditos ou respondendo pelos abusos que por ventura ocorra.

Portanto, a manifestação do pensamento estará condicionada ao não anonimato, mas há exceções. Quando as informações prestadas possam colocar em risco a vida do informante, este tem o direito de se manter oculto, como, por exemplo, nas delações contra organizações criminosas, inclusive, tal atitude é incentivada pelo Estado através dos disk denúncias.

Também, assegura-se o sigilo quanto às fontes de origem de informações recebidas ou recolhidas por jornalistas, rádio-repórteres ou comentaristas[24] nos casos em que o informante possa sofrer retaliações ou risco de morte, respondendo aos abusos, neste caso, quem divulgar a informação.

Da mesma forma, o direito à manifestação do pensamento encontra óbices nos casos de danos à personalidade, discriminação ou racismo, pois o Estado brasileiro busca o bem de todos sem preconceito de origem, raça, cor, religião, trabalho, idade e quaisquer outras formas de discriminação[25], primando pela isonomia perante a lei[26] e pela tutela à personalidade, conforme rol do artigo 5º:

“V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; (…)

X -são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.

A manifestação do pensamento discriminatória está estritamente proibida, respondendo o autor, na esfera cível, pelos danos morais e patrimoniais causados pela informação e, na esfera penal, responderá pelos crimes de injúria, difamação ou racismo.

Ana Marina Nicolodi[27], em seu artigo intitulado Conflitos entre direitos fundamentais – liberdade de imprensa versus direito à vida privada, direito à imagem e direito à honra, publicado na Revista Jus Vigilantibus, discorre que o direito à intimidade e à imagem são de igual hierarquia constitucional à liberdade de expressão e de informação, não subsistindo  diferença de qualidade entre os direitos juridicamente tutelados, sendo possível a prevalência, por meio de ponderação casuística entre os bens e valores jurídicos sub examine.

Assim, quando se conflitam direitos fundamentais, caberá aos aplicadores da lei, analisando as peculiaridades de cada caso concreto, ponderar os bens jurídicos, valorando, por meio da razoabilidade, à qual direito fundamental deverá ser restringido para fazer prevalecer a unidade axiológica da Constituição Federal.

5. A INTERNET COMO ALTERNATIVA À LIBERDADE DE EXPRESSÃO DOS MILITARES.

A rede mundial de computadores, popularmente conhecida de internet, foi uma verdadeira revolução ao sistema de comunicação mundial, propiciando a troca de informações por quase todo o planeta. Trata-se de um conglomerado de computadores interligados por rede que possibilita a transferência de dados. De acordo com informações extraídas da Winkpédia[28], a internet era utilizada no ano de 2007 por 16,9 % da população mundial, cerca de 1,1 bilhões de pessoas. Hoje estima-se que esse número ultrapassa os de 1,7 bilhão de pessoas. .

Surgiu durante o período da Guerra Fria (1947-1991), com intuito de armazenar informações secretas dos Estados Unidos em caso de ataque da Ex União Soviética. Em menos de 04 (Quatro) anos de criação, a internet já conseguia atingir cerca de 50 (cinquenta) milhões de pessoas.

Em 1997, com a popularização da internet, surgiram os blogs que são uma espécie de sites com estrutura para atualização rápida e simples, organizados de forma cronológica inversa, podendo ser escrito por uma ou mais pessoas. A maioria deles funciona como um diário “on line”, onde o autor escreve seu pensamento, coloca fotos, vídeos, musicas, etc, possibilitando a interação entre leitores e autores através de espaços reservados para comentários.

Os blogs dominaram a internet. No ano de 2007 já eram mais de 112 milhões de blogs por todo o mundo, tratando dos mais variados assuntos e, por isso, a palavra blog assumiu o significado de mídia onde o indivíduo expresse sua opinião[29].

Os servidores do setor da segurança pública viram a nova idéia como forma de discutir os assuntos relacionados às suas atividades, tecendo críticas e propondo inovações ou simplesmente repassando as notícias de interesse às categorias.

A participação dos servidores da Segurança Pública no Brasil em blogs ainda é pequena, mas vem crescendo rapidamente. De acordo com informações extraídas blog Diário de um policial Militar[30], em 2006 havia 7 (sete) blogs relacionados à segurança pública e polícia, todos do Rio de Janeiro. No início do ano de 2008 essa lista contava com 37 (trinta e sete) blogs distribuídos em nove Estados brasileiros, no final de 2008 esta lista já ultrapassava 60 (sessenta) blogs distribuído em 14 (quatorze) Unidades Federativas, conforme tabela 1 e 3  anexas.

Durante os meses de abril e maio de 2009, tentou-se, de forma simplória, analisar a atuação destes 60 (sessenta) blogs relacionados à segurança pública com intuito de verificar sua relação com a liberdade de expressão dos servidores da segurança pública.

O primeiro tópico analisado nos blogs foi a territoriedade. A Unidade da Federação que mais possui blogs relacionados com a segurança pública é o Estado do Rio de Janeiro, tendo catalogado 27 (vinte sete) blogs, em segundo lugar vem o Estado de São Paulo com 8 (oito) blogs, depois vem Bahia e Distrito Federal com 4 (quatro) blogs, em seguida aparece o Estados do Rio Grande do Sul com 3 (três) blogs, depois contando com (02) dois blogs aparecem os Estados do  Mato Grosso, Minas Gerais, Piauí e Sergipe. Os Estados de Amapá, Goiás, Pará, Pernambuco, Rio Grande do Norte contam com apenas 01 (um) blog. Não foram observados a existência de blogs nos demais Estados brasileiros. (Ver Tabelas 1 e 2 anexas).

O fato de os servidores da segurança pública do Estado do Rio de Janeiro serem os pioneiro e os que mais aderiram ao novo sistema de mídia digital, os blogs, como meio de exercer a liberdade de expressão, é facilmente explicado pelas péssimas condições de trabalho, pela falta de garantia de direitos, entre os quais destaco que são os servidores da segurança pública pior remunerados do Brasil, bem como por serem os que mais morrem e matam em combate ao crime.

Outro fato observado, foi crescimento expressivo dos blogs entre os servidores da segurança pública, acumulando o crescimento de aproximadamente 1000% (mil por cento) em dois anos, fato que tornou objeto de estudo das Nações Unida para Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) em parceria com o centro de Estudo de soluções para a segurança pública (CESeC) da Universidade Cândido Mendes, do Rio de Janeiro conforme noticiou-se a Agencia do Estado em artigo escrito por Mário Sergio Lima[31] . (Ver tabelas 1 e 3 anexas)

Assevera ainda Mário Sergio Lima que além do exercício do direito à liberdade de expressão exercida pelos servidores da segurança pública por meio dos blogs, essa tendência trouxe mais motivação à categoria que vem ampliando a discussão e trocando informações entre eles. Aponta ainda que a explicação para o fenômeno crescente dos blogs dá-se devido ao choque entre os novos policiais que vem entrando na corporação.

Estão em voga nos blogs dois temas principais. A melhoria da condição de trabalho e salários e por outro lado a censura, inclusive, com notícias de punições disciplinares decorrente de crítica ao governo e ao sistema de segurança pública entre os quais destaco os blogs do Maj Wanderby[32] e o Jusmilitar[33] cujo blog é de minha autoria.  .

Acessando a cada um dos 60 (sessenta) blogs, pôde-se observar, também,  que cerca de 30% (trinta por cento) deles são de autores anônimos, bem como uma a maioria dos comentários de leitores são postados por anônimos. (ver tabelas 1 e 4 anexas)

Com efeito, ao criarmos blog Jusmilitar- site em defesa dos militares em julho de 2007, foi possível observar que cerca 90% (noventa por cento) dos comentários e acessos vêm de servidores da segurança pública e entre esses comentários pelo menos 80% (oitenta por cento) são postados anonimamente ou são identificados através de pseudônimos.

O anonimato entre os servidores da segurança pública advém, em regra, não por força de normativa, visto que quando a declaração não vai de encontro ao interesse do governo ou do comandante o militar não é repreendido, todavia quando o militar se expressa de forma contrária ao interesses dos detentores do poder a punição ou perseguição é certa. A título de exemplo, dos meus cinco anos de trabalho no Corpo de Bombeiros Militar do Estado de Mato Grosso eu nunca havia sido convidado a participar de uma reunião deliberativa na Instituição. A primeira, da qual participei foi justamente a Conferência Municipal do CONSEG (Conferência Nacional de Segurança Pública) em Cuiabá-MT e quando se teve a oportunidade de se expressar, comentando das dificuldades encontradas e da necessidade da melhoria da condição de trabalho,  este autor foi repreendido com a seguinte frase: “Lopes, se você está achando ruim, pede baixa”. Absurdo!

Tais fatos nos demonstram que o cerceamento da liberdade de expressão, o medo e a injustiça pairam sobre os servidores da segurança pública de baixa patente. Desta forma, a alternativa encontrada para minimizar a censura foi a internet por meio dos blogs, local propício à discussão em prol da melhoria da segurança publica no Brasil.

6. CONCLUSÃO.

Todos – militares e civis – têm direito à liberdade de pensamento e de expressão, podendo buscar, receber e difundir informações e idéias, verbalmente ou por escrito, artística ou cientificamente por qualquer processo ou meio que deseje, não podendo o Estado ou instituições proibir ou cercear esse direito sob o pretexto de “segurança nacional” ou  “hierarquia e disciplina”, visto que a liberdade de expressão é fundamento de um Estado Democrático de Direito, inclusive, tutelada constitucionalmente nos termos dos incisos IV, IX, XIII, LXXII do art. 5º.

A livre manifestação do pensamento foi uma conquista difícil em progressão histórica na qual se destaca, dentre muitos, que os principais acontecimentos que sucederam até o pleno reconhecimento desse direito: Declaração dos Direitos do Bom povo de Virgínia (1776),a Revolução Francesa e a Declaração dos Direitos do Homem (1789), a Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948), Constituição da República Federativa do Brasil (1988) e o reconhecimento pela Corte Constitucional Brasileira, Supremo Tribunal Federal, de que a liberdade de expressão é livre nos termos da constituição, sendo portanto inconstitucional a sua regulamentação por lei. (2009)[34].

Nestes termos, o artigo 166 do Código Penal Militar, bem como as normas dispostas nos Regulamentos Militares que restrinjam ou cause embaraços à livre manifestação do pensamento são normas atentatórias aos fundamentos do Regime Democrático e da Republica Federativa do Brasil e, por isso, deve ser expurgada para sempre do nosso sistema jurídico.

Considerar como crime a liberdade de expressão dos militares é torná-los parte de uma subclasse de cidadãos, já que não lhe são garantidos a plenitude dos direitos fundamentas, principalmente ao que concerne à livre manifestação do pensamento que é um direito inerente à espécie humana, deixando-o à escala de mero animal.

É livre a manifestação do pensamento, a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, a criação, a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, não podendo nenhuma lei restringir tais direitos, sendo, portanto, vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística, assim como, veda-se a aplicação de qualquer sanção não disposta na Carta Magna Brasileira, pois é límpida essa garantia no inciso IV do artigo 5º o qual expõe que “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”, não havendo, em hipótese alguma, a possibilidade de cogitar que tal direito seja vedado ao militar, pois retiraria deste a dignidade da pessoa humana, bem como roubaria da sociedade o direito ao acesso à informação plena, impondo ao país um período de Exceção oculta.

Conclui-se, portanto, que o único meio idôneo a melhoria da prestação de serviço em segurança pública no Brasil é a garantia de proteção dos direitos fundamentais de todos os cidadãos – inclusive os da segurança pública – através de políticas sociais e sistema normativo legítimo, democrático e obediente aos princípios constitucionais, criando um ambiente apto à discussão aberta e coerente acerca da segurança pública e dos meios para a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, com garantia de desenvolvimento e erradicação das todas as formas de discriminação.

 

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REVISTA JUS VIGILANTIBUS, Segunda-feira, 1º de outubro de 2007
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6023 Referências bibliográficas, NBR 6024 Numeração progressiva das seções de um documento, NBR 6027 Sumários, NBR 6028 Resumos, NBR 6029, Apresentação de livros e folhetos – Procedimento, NBR 6032, Abreviação de títulos de periódicos e publicações seriadas – Procedimento, NBR 6822, Preparo e apresentações de normas brasileiras – Procedimento, NBR 10520, Apresentação de citações em documentos, NBR 10524, Preparação da folha de rosto de livro – Procedimento, NBR 10719, Apresentação de relatórios técnicos-científicos, NBR 12225 Títulos de lombada – Procedimento. Disponível em http://www.abnt.org.br, acesso em entre 20 a 30 de maio de 2009.
Notas:
[1] Texto adaptado da Monografia Liberdade de Expressão dos Policiais e Bombeiros Militares. Apresentada no 1º Concurso de Monografia do SENASP,  obtendo a 2ª colocação.
[2] STF. HC nº 83.125-7 DF, relator Ministro Marco Aurélio, Primeira Turma, julgamento 16/09/2003, DJ 07/11/2003 coator Superior Tribunal Militar.
[3] MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentários à Constituição de 67, tomo V, 3ª p 150
[4] STF. Voto do Ministro do STF, Carlos Ayres Brito, relator da ADPF nº 130 em decisão em  Sessão Plenária do dia 28 de abril de 2009.
[5] FARIAS, Edilsom. Democracia, censura e liberdade de expressão e informação na Constituição Federal de 1988Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 51, out. 2001. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2195&gt;. Acesso em: 15 fev. 2009.
[6] FERREIRA, Pinto. Código Eleitoral Comentado. v1. p  68
[7] FISCHER, Desmond. O Direito de Comunicar, Expressão, Informação e Liberdade. p 19 e 91
[8] FERREIRA, Aluízio. Direito à informação, direito à comunicação: direitos fundamentais na Constituição Brasileira. p 87
[11] LOUREIRO NETO, José da Silva. Direito Penal Militar. p 134
[12] CAPEZ, Fernando. Curso de direito e penal; parte especial, p 15
[13] LOUREIRO NETO, José da Silva. Direito Penal Militar. p 23
[14] ADPF 130, Sessão Plenária do dia 30 de abril de 2009. Disponível em http://www.stf.jus.br
[15] Publicado no Diário Oficial da União no dia 9 de novembro de 1992, pp 15.562-15.567
[16] SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. Ed 24, São Paulo: Malheiros, 2005, p 244
[17] ADPF 130-MC, Rel. Min. Carlos Britto, julgamento em 27-2-08, DJE de 7-11-08
[18] CARVALHO, Luis Gustavo Grandinetti Castanho de. Liberdade de Informação e o Direito Difuso a Informação Verdadeira.p 65
[19] Constituição Federal, artigo 5º, inciso X.
[20] MOTTA FILHO, Sylvio Clemente da. Direito Constitucional: teoria, jurisprudência e 1.000 questões. 17ed. p 72
[21] Constituição Federal, artigo5º § 1º – “As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata”
[22] STF – HC 82.424, Rel. p/ o ac. Min. Maurício Corrêa, julgamento em 17-9-03, DJ de 19-3-04
[23] Constituição Federal, Artigo 5º, inciso IV
[24] Lei de Imprensa – Lei nº. 5.250 de 09 de fevereiro de 1967 – Artigo 7º da
[25] Constituição Federal, artigo 3º, inciso IV
[26] Constituição Federal, artigo 5º, caput, inciso, VIII e XIII
[27] REVISTA JUS VIGILANTIBUS, Segunda-feira, 1º de outubro de 2007
[28] PORTUGAL. WINKIPÉDIA.  Site de internet aberto, no qual se incluem informações criando uma gigantesca enciclopédia digital, já tendo catalogado mais de 1 milhão de artigos. Endereço: http://pt.wikipedia.org/wiki/Hist%C3%B3ria_da_Internet. Acessado em 15 de maio de 2009.
[30] SOUZA, Alexandre.  A blogosfera da segurança publica cresceu e agora precisa dialogar.  Diario de um Policial Militar,  26/nov. 2006. Disponível em:  http://www.diariodeumpm.net/2006/11/25/a-blogosfera-da-seguranca-publica-cresceu-e-agora-precisa-dialogar/ Acesso em: 15 maç. 2009.
[31] LIMA, Mário Sérgio Lima. Agencia do Estadão. Blogosfera Policial Cresce e vira estudo da ONU. http://www.estadao.com.br/noticias/cidades,blogosfera-policial-cresce-no-brasil-e-vira-estudo-da-onu,352987,0.htm. Acesso em 20 de maio de 2009.
[32] www.wanderbymedeiros.blogspot.com
[33] Jusmilitar-  Site em defesa dos militares – www.jusmilitar.blogspot.com
[34] Sessão Plenária do STF de 30 de abril de 2009, na qual declarou que a Lei de Imprensa (Lei nº 5250/67) é incompatível com a atual Constituição Federal de 1988 – “Nada mais nocivo e perigoso do que a pretensão do Estado de regular a liberdade de expressão e pensamento”, disse o ministro Celso de Mello

Informações Sobre o Autor

Júlio César Lopes da Silva

Licenciatura Plena em Letras Português/Inglês pela UFMT; Bacharel em Direito pela faculdade ICEC/UNIP; Técnico em Turismo pelo CEFET-MT, Especialização em Direito do Trabalho, Professor e Militar do Corpo de Bombeiros Militar do Estado de Mato Grosso, http://www.jusmilitar.blogspot.com.

Fonte: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=8797

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A liberdade de expressão dos Policiais Militares no âmbito das redes sociais: Questões para reflexão

Durante os debates sobre liberdade de expressão dentro da Polícia Militar com o amigo e advogado Victor Minervino Quintiere, autor do livro “Intimidade Vs. Liberdade de Expressão: Os critérios axiológicos na Jurisdição Constitucional brasileira” surgiu a ideia sobre o artigo abaixo, nós do Blog Policiamento Inteligente, agradecemos ao Dr. Victor Minervino pela gentileza e esperamos contar com mais artigos sobre o tema.

Victor Minervino é Mestre em Direito pelo Instituto Brasiliense de Direito Público – IDP. Membro da Comissão de Assuntos Constitucionais da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional de Brasília – CAC/DF. Sócio do escritório Bruno Espiñeira Lemos & Quintiere Advogados. Professor universitário. Consultor jurídico da Rádio Justiça e autor e co-autor de vários livros.

O artigo Abaixo foi escrito em conjunto com Gustavo Lima Soares, Bacharel em Administração de Empresas pela UCB – Universidade Católica de Brasíla, bacharelando em Direito pelo UniCEUB – Centro Universitário de Brasília, e membro do escritório Bruno Espiñeira Lemos & Quintiere Advogados.

A LIBERDADE DE EXPRESSÃO DOS POLICIAIS MILITARES NO ÂMBITO DAS REDES SOCIAIS: QUESTÕES PARA REFLEXÃO

GUSTAVO LIMA SOARES[1]

VICTOR MINERVINO QUINTIERE[2]

 RESUMO: Os direitos fundamentais se sedimentaram na sociedade durante o desenvolvimento das civilizações, desde os direitos fundamentais de primeira geração até os direitos fundamentais de quinta geração, o rol de direitos fundamentais partiram de liberdades individuais e se expandiram a ponto de tratarem da paz universal. Um desses direitos adquiridos foi a liberdade de expressão, que ganha ainda mais ênfase com o advento das redes sociais. Na contramão disso está a regulamentação de tal direito no âmbito militar, diante disso, a reflexão principal deste artigo se dá na necessidade/possibilidade de relativizar a liberdade de expressão no âmbito militar.

Palavras-chave: Direitos Fundamentais. Liberdade de expressão. Militares. Redes sociais.

ABSTRACT: Fundamental rights have settled in society during the development of civilizations, from first generation of fundamental rights to fifth generation of fundamental rights, the list of fundamental rights started from individual freedoms and expanded to universal peace. One of these acquired rights is freedom of expression, which gains even more emphasis with the advent of social networks. Contrary to this is the regulation of this right in the military sphere, on the face of it, the main reflection of this article is the need/possibility of relativizing freedom of expression in the military sphere.Key-words: Fundamental Rights. Freedom of speech. Militaries. Social networks.

          

 Introdução

             Com o fim do regime militar e a redemocratização do país e, principalmente, com o advento da Constituição Federal de 1988, os cidadãos brasileiros recuperaram diversos direitos fundamentais inerentes à qualquer pessoa. Dentre o vasto rol de direitos adquiridos encontramos o direito à liberdade de expressão, direito este essencial não só para a garantia de dignidade da pessoa humana, mas também para alicerçar a democracia em nosso país.

            O advento das redes sociais concedeu às pessoas uma nova forma de exercer o  direito à liberdade de expressão. Cada vez mais, as pessoas utilizam as suas páginas nas redes para manifestar, livremente, seus pensamentos, ideias e opiniões sobre a mais vasta gama de temas e assuntos.

            Indo na contramão das mudanças e avanços sociais, está a existência de tal direito na categoria dos militares. Atualmente, diversos militares, sejam eles policiais ou bombeiros, estão sofrendo acusações em Inquéritos Policiais Militares (IPM) por usarem as suas redes sociais para manifestarem posições de insatisfação com questões ligadas ao exercício de sua profissão, ou mesmo manifestarem oposição ao Governo. Sob a alegação de respeito à hierarquia e a disciplina, diversos militares não podem exercer o direito readquirido com a Carta Magna de 1988.

            Em dezembro de 2010, o Ministério da Justiça publicou as Diretrizes Nacionais de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos dos Profissionais de Segurança Pública, esse documento, dentre outros assuntos, trouxe diversas demandas coletadas através de reuniões com as diversas classes de policiais (federal, rodoviário federal, civil, militar, dentre outros). Neste contexto, oportuno trazer à baila o primeiro e o terceiro pontos do tópico da sessão “Direitos Constitucionais e Participação Cidadã” das diretrizes supracitadas:

1)Adequar as leis e regulamentos disciplinares que versam sobre direitos e deveres dos profissionais de segurança pública à Constituição Federal de 1988;

(…)

3)Assegurar o exercício do direito de opinião e a liberdade de expressão dos profissionais de segurança pública, especialmente por meio de internet, blogs, sites e fóruns de discussão, à luz da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2010, p. 9).

            Nesta senda, o presente artigo busca discutir até que ponto essa restrição ao direito fundamental é considerada necessária e se, principalmente, já não está na hora de se repensar os critérios que definem uma manifestação como um ato de indisciplina ou de insubordinação hierárquica, a fim de conceder as liberdades previstas na Constituição Federal de 1988 aos servidores da polícia militar. 

  1. Breve retrospecto acerca dos Direitos Fundamentais envolvidos

          Antes de nos debruçarmos especificamente sobre a liberdade de expressão, é válido fazer algumas reflexões sobre os direitos fundamentais e as suas respectivas gerações.

            Mendes e Branco (2017) afirmam que os direitos fundamentais estão sedimentados graças à maturação histórica. As teorias contratualistas nos séculos XVII e XVIII, a Declaração de Direitos de Virgínia em 1776 e a Declaração Francesa de 1789 são documentos históricos que auxiliam na compreensão de como os direitos fundamentais se sedimentaram na sociedade, e como se inverteu a tradicional relação entre Estado e indivíduo (MENDES; BRANCO, 2017).

            A análise histórica será realizada no próximo tópico, por ora, precisamos entender melhor o que é necessário para a existência dos direitos fundamentais e como podemos conceituar os referidos direitos.

Dimoulis e Martins (2014) afirmam que para o nascimento dos direitos fundamentais é preciso existir três elementos: o Estado, o Indivíduo e um texto que regule a relação entre Estado e indivíduos.

            No que tange ao Estado, nos referimos aqui ao Estado Moderno, àquele com poder centralizado, capaz de controlar o próprio território e impor suas decisões por meio da administração pública(DIMOULIS; MARTINS, 2014).

            Quando se fala em indivíduos, estamos falando de um ser independente e autônomo capaz de fazer valer seus direitos tanto perante o Estado quanto perante a sociedade.

É importante diferenciar essa concepção de indivíduo, pois nas sociedades antigas as pessoas eram consideradas como membros de grandes ou pequenas coletividades, sendo subordinadas às coletividades e privadas de seus direitos (DIMOULIS; MARTINS, 2014).

            O terceiro e último aspecto seria o texto que regula as relações entre o Estado e os indivíduos. Seria uma Constituição no sentido formal a fim de garantir que o Estado, de maneira alguma, cerceie as esferas de direitos garantidas no interior do texto (DIMOULIS; MARTINS, 2014).

            Portanto, quando se relaciona esses conceitos podemos definir os direitos fundamentais como o cerne da proteção da dignidade da pessoa humana, e que não há melhor lugar para positivar esses direitos senão a Constituição, norma soberana do ordenamento jurídico (MENDES; BRANCO, 2017).

         1.2 Gerações dos direitos fundamentais

           Uma das perspectivas históricas acerca da evolução dos direitos fundamentais é a divisão dos mesmos em cinco gerações. A primeira geração dos direitos fundamentais tem como ponto de partida o direito comunal europeu, que se funda na liberdade e na igualdade, e que se concretiza com a queda do absolutismo, onde foram garantidos aos cidadãos diversos direitos a fim de que o Estado não se envolvesse na vida particular das pessoas (QUINTIERE, 2016).

            Diante dessa primazia dos direitos individuais, principalmente no continente europeu, a corrente liberal se tornou individualista e com isso diversas desigualdades sociais emergiram. De um lado se tinha uma minoria detentora dos meios de produção, e de outro uma vasta maioria que trabalhava em péssimas condições. Diante disto, se instalou um contexto onde não cabia mais o individualismo, logo surgem os direitos fundamentais de segunda geração (reinvindicações das classe oprimidas), que visam justamente trazer uma certa justiça social (QUINTIERE, 2016).

            Já os direitos fundamentais de terceira geração são, na visão da doutrina, direitos dotados de aspectos humanistas e universais. Esses direitos transcendem o indivíduo, e passam a tratar de um grupo ou até mesmo de um Estado (QUINTIERE, 2016). A idiossincrasia dos direitos fundamentais de terceira geração é a titularidade difusa, uma vez que visam proteger coletividades (MENDES; BRANCO, 2017).

            Os direitos de quarta geração seriam os direitos relacionados à engenharia genética. Além disso, parte da doutrina defende os direitos de quarta geração em detrimento dos efeitos da globalização, dando tratamento de direitos fundamentais de quarta geração aos direitos de informação e pluralismo (QUINTIERE, 2016).

            Portanto, para encerrar esse breve síntese acerca das gerações de direitos fundamentais existem doutrinadores que defendem a existência da quinta geração de direitos fundamentais. Essa geração destaca o direito à paz universal, dados os acontecimentos que vêm perturbando a paz mundial (QUINTIERE, 2016).

  1. Liberdade de expressão

           Os atuais Estados democráticos se caracterizam por conterem em seus textos constitucionais o direito à liberdade de expressão e informação. Os dois direitos supracitados deduzem-se do direito a liberdade de pensamento, pois do que adiantaria pensar se não fosse possível externar este pensamento? Diante disso, o direito à liberdade de expressão tem sido um dos mais estimados direitos inerentes ao homem (FARIAS, 1996).

            A Inglaterra foi a nação pioneira na luta pela liberdade de expressão. Farias (2012, p.129) afirma que o ápice dessa luta se deu quando “o Parlamento, em 1965, resolveu reiterar o Licensing Act, que estabelecia a censura prévia.

            A França também tratou do tema no Art. 11 da Déclaration des Droits de l’Homme et du Citoyen em 1789:

La libre communication des pensées et des opinions est un des droits les plus précieux de l’Homme : tout Citoyen peut donc parler, écrire, imprimer librement, sauf à répondre de l’abus de cette liberté dans les cas déterminés par la Loi[3] (FRANCE, 1789, p. 1).

            O constituinte norte-americano também tratou do tema na First Amendment de 1791 ao dizer que “Congress shall make no law respecting an establishment of religion, (…), or abridging the freedom of speech, or of the press (…)[4].

            A Constituição da Alemanha também trata da liberdade de expressão no seu Art. 5:

Jeder hat das Recht, seine Meinung in Wort, Schrift und Bild frei zu äußern und zu verbreiten und sich aus allgemein zugänglichen Quellen ungehindert zu unterrichten. Die Pressefreiheit und die Freiheit der Berichterstattung durch Rundfunk und Film werden gewährleistet. Eine Zensur findet nicht statt[5] (DEUTSCHLAND, 1949, p.2).

            Assim sendo, a Constituição do Brasil de 1988[6] também figura no rol de Constituições que garantem o direito à liberdade de expressão.

Diante dos fragmentos constitucionais expostos, Farias (1996, p. 131) afirma que a liberdade de expressão pode ser entendida do seguinte modo:

direito subjetivo fundamental assegurado a todo cidadão, consistindo na faculdade de manifestar livremente o próprio pensamento, ideias e opiniões através da palavra, escrito, imagem ou qualquer meio de difusão, bem como no direito de comunicar ou receber informação verdadeira, sem impedimentos nem discriminações (FARIAS, 1996, p131).

            Conforme o conceito supracitado de Farias (1996), o direito à liberdade de expressão pode se dar das mais variadas maneiras, através de imagens, gestos e qualquer meio de difusão da informação.

Como exemplo disso, o STF decidiu, recentemente, que marchas e manifestações públicas podem ser consideradas como maneira de exercer a liberdade de expressão através do direito de reunião[7] (MENDES; BRANCO, 2017, p.269).

            A liberdade de expressão sofre restrições, alguns dos limites para o exercício deste direito foram previstos pelo próprio constituinte, como por exemplo: i) vedação do anonimato; ii) imposição do direito de resposta e a indenização por danos morais e patrimoniais e à imagem; iv) para assegurar o acesso à informação para todos; v) para exigir qualificação profissional dos que se dedicam aos meios de comunicação; vi) para restringir a publicidade de bebidas alcoólicas, tabaco, medicamentos e terapias; iv) impõe, por fim, para a produção e a programação das emissoras de rádio e de televisão, o respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família, conforme disposto no Art. 220, §3º, II (QUINTIERE, 2016).

            Além das restrições supracitadas, o direito à liberdade de expressão também sofre limitações quando colide com outros direitos com o mesmo status que o seu, como por exemplo, quando entra em conflito com o direito à honra, à intimidade, dentre outros (QUINTIERE, 2016, p. 34).

            Mendes e Branco (2017, p. 271) vão além e afirmam que “leis de índole geral, que não tenham como objetivo a restrição às mensagens e às ideias transmitidas pelo indivíduo, podem também interferir, indiretamente, sobre a liberdade de exprimi-las”. Os referidos autores trazem alguns exemplos disso, como a proibição de buzinar em frente a hospitais, ou até mesmo leis que tratam da proibição de outdoors em determinadas localizações.

  1. O Direito Militar

            O Direito Militar pode ser definido como um conjunto de normas jurídicas de natureza militar. Dentro do vasto rol de normas jurídicas militares, destacam-se as seguintes: i) Código Penal Militar (Decreto-lei nº 1.001, de 21 de outubro de 1969); ii) Código de Processo Penal Militar (Decreto-lei nº 1.002, de 21 de outubro de 1969); iii) Estatuto dos militares (Lei nº 6.880, de 9 de dezembro de 1980) (MARTINS, 2003). Há, também, no texto Constitucional diversas disposições acerca dos militares, como por exemplo, art. 5º, VII, XLIV, LXI.

            Para os fins deste artigo, será aprofundado o estudo do direito militar no que tange aos princípios da hierarquia e disciplina, pois estes são os princípios que são utilizados para afastar dos militares o exercício da liberdade de expressão, especialmente no âmbito das redes sociais.

            3.1 Princípios da hierarquia e disciplina

            Martins (2003) afirma que os princípios de hierarquia e disciplina não estão presentes somente no contexto das forças militares, mas é em tal conjuntura que esses princípios são potencializados.

            No que tange ao texto Constitucional, há menção a estes dois princípios no caput do Art. 42[8] e Art. 142[9]. Já na legislação infraconstitucional, os princípios da hierarquia e disciplina estão dispostos no capítulo III do título I do Estatuto dos Militares.

            Segundo o Estatuto dos Militares, Art. 14, caput, “a hierarquia e a disciplina são a base institucional das forças armadas. O §1º do referido artigo diz que a hierarquia pode ser definida como a “ordenação de autoridade, em níveis diferentes, dentro das forças armadas” e o respeito à hierarquia é “consubstanciado no espírito de acatamento à sequência de autoridade”. Vale ressaltar que cada em cada unidade da federação a polícia militar possui seu próprio estatuto, mas este está sempre em consonância com o Estatuto Militar.

            Já a disciplina é definida no §2º do Art 14 da lei nº 6.880 de 1980 como “rigorosa observância e o acatamento integral das leis, regulamentos, normas e disposições que fundamentam o organismo militar e coordenam seu funcionamento regular e harmônico”.

            Por fim, o §3º do Art. 14 diz que “a disciplina e o respeito à hierarquia devem ser mantidos em todas as circunstâncias da vida entre militares da ativa, da reserva remunerada e reformados”.

  1. Liberdade de expressão vs Art. 166 do Código Penal Militar

            Quando o policial militar, através de suas redes sociais, expressa sua opinião ou seu pensamento contrário a questões ligadas ao exercício de sua profissão, ou mesmo quando manifesta oposição ao Governo, sofre as sanções do Art. 166 do Código Penal Militar que dispõe o seguinte:

Publicação ou crítica indevida

Art. 166. Publicar o militar ou assemelhado, sem licença, ato ou documento oficial, ou criticar publicamente ato de seu superior ou assunto atinente à disciplina militar, ou a qualquer resolução do Governo:

Pena – detenção, de dois meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave. (BRASIL, 1969, p. 33)

            Nucci (2014), ao tratar do artigo supracitado, o interpreta da seguinte maneira:

A segunda parte do tipo abrange a conduta de criticar (censurar, tecer comentários negativos) no tocante a ato de superior ou assunto ligado à disciplina militar, bem como a resolução do Governo. Tal crítica, para constituir crime, deve ser pública, portanto de conhecimento abrangente, envolvendo várias pessoas (NUCCI, 2014).

            Portanto, os policiais militares que fazem publicações acerca dos temas supracitados, sofrerão algum tipo de sanção. Nesta esteira, o Ministro Sepúlveda Pertence se posicionou a favor de tratar as falas dos policiais militares com menos severidade, pois segundo ele, as polícias militares são instituições militarizadas, mas a sua função de policiamento ostensivo e de preservação da ordem pública tem caráter eminentemente civil, ao contrário das Forças Armadas que são instituições militares por sua própria natureza[10].

            Infelizmente, o entendimento que se tem acerca deste tema atualmente vai na contramão do entendimento do Ministro Pertence. Recentemente, o Tribunal de Justiça Militar do Rio Grande do Sul negou provimento a uma apelação cível[11] onde o impetrante alegava que as suas declarações contrárias ao Governador de Estado não poderiam ser consideradas como um crime que culminou com uma sanção de cinco dias de prisão.

            De acordo com reportagem da BBC, em 21 de setembro de 2016, um policial militar do Rio Grande do Norte foi condenado a quinze dias de prisão por fazer uma crítica ao modelo de polícia adotado no Brasil. No BG nº 176 de setembro de 2016, cometeu transgressão disciplinar ao proferir palavras que não condizem com a ordem castrense (SENRA, 2016).

            Um caso ainda mais recente do que o supramencionado ocorreu em 16 de junho de 2017. Um policial do da PM/ES foi preso em sua casa por criticar ações do governador, do secretário de segurança e do comandante da PM (MENDONÇA; SILVA. 2017).

            Diante disso, percebe-se que os policiais militares sofrem restrição ao direito da liberdade de expressão, e que quando se confronta a liberdade de expressão com o Direito Castrense, o último tende a prevalecer.

Ante essas constatações, a indagação que fica para o leitor é a seguinte: até que ponto essa restrição ao direito de liberdade é benéfica para o próprio desenvolvimento do militarismo no Brasil?

  1. Conclusão

             Diante da análise dos direitos fundamentais e das normas jurídicas do Direito Castrense, foi possível chegar a algumas conclusões sobre o direito à liberdade de expressão dos policiais militares.

            No derradeiro tópico do presente artigo, o objetivo foi o de fazer uma reflexão acerca da liberdade de expressão dos policiais militares, em especial nas redes sociais, e chegar a uma conclusão se já não é hora de se aperfeiçoar o atual entendimento sobre esse tema.

            No que tange ao direito a liberdade de expressão podemos concluir que o mesmo é peça essencial na manutenção da democracia do país. De acordo com o que foi tratado anteriormente, percebeu-se que qualquer nação que preza pela democracia prevê esse direito fundamental.

            Depois, quando se tratou do direito militar, constatou-se que a hierarquia e disciplina são essenciais para a manutenção da ordem interna das organizações militares.

Diante da importância da polícia militar para a manutenção da ordem pública, é mais do que compreensível que se faça necessário o respeito aos princípios supramencionados. Ora, como poderia a polícia militar manter a ordem pública se não conseguisse manter sequer a ordem interna da organização?

            A conclusão que se chega diante do objetivo maior deste trabalho é que sim, a polícia militar realmente precisa prezar pela disciplina e hierarquia, mas o direito constitucional a liberdade de expressão deve ser garantido aos membros das corporações, pois antes de serem militares eles são cidadãos. Diante disto, é preciso aperfeiçoar esse tema, diante, dentre outros aspectos, das péssimas condições de trabalho e pelo fato de que muitas vezes não são vistos com bons olhos pela sociedade.

Para o aperfeiçoamento do sistema militar brasileiro, a voz de seus integrantes deve ser ouvida.

  1. Referências

 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm&gt;. Acesso em: 19 ago. 2017.

BRASIL. Decreto-lei nº 1.001, de 21 de outubro de 1969. Código Penal Militar. Brasília, 21 out. 1969. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del1001.htm&gt;. Acesso em: 21 ago. 2017.

BRASIL. Lei nº 6.880, de 9 de dezembro de 1980. Estatuto dos Militares. Brasíia, 9 dez. 1980. Disponível em <http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1980-1987/lei-6880-9-dezembro-1980-356681-normaatualizada-pl.html&gt; Acesso em: 21 ago. 2017.

BRASIL. Ministério dos Direitos Humanos. Ministério da Justiça. Portaria interministerial nº 2, de 15 de dezembro de 2010. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, 16 dez. 2010. Disponível em <http://www.policiacivil.pe.gov.br/images/docs/diretrizes_nacionais_de_promocao_e_defesa_dos_direitos_humanos_dos_profissionais_de_seguranca_pub.pdf&gt;. Acesso em: 18 ago. 2017.

DEUTSCHLAND. Constituição (1949). Grundgesetz Für Die Bundesrepublik Deutschland. Disponível em: <https://www.gesetze-im-internet.de/gg/GG.pdf&gt;. Acesso em: 19 ago. 2017.

DIMOULIS, Dimitri; MARTINS, Leonardo. Teoria geral dos direitos fundamentais: revista, atualizada e ampliada. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2014. Disponível em: <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/books/9788522487226&gt;. Acesso em: 18 ago. 2017.

FARIAS, Edilsom Pereira de. Colisão de direitos: a honra, a intimidade, a vida privada e a imagem versus a liberdade de expressão e informação. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1996. 168 p.

FRANCE. Constituição (1789). Déclaration Des Droits de L’homme Et Du Citoyen de 1789. Disponível em: < http://www.conseil-constitutionnel.fr/conseil-constitutionnel/francais/la-constitution/la-constitution-du-4-octobre-1958/declaration-des-droits-de-l-homme-et-du-citoyen-de-1789.5076.html&gt; Acesso em: 19 ago. 2017.

MARTINS, Eliezer Pereira. Direito Militar Constitucional. Disponível em < http://www.amajme-sc.com.br/livro/11-%20Eliezer-Pereira-Martins.pdf&gt; Acesso em: 20 ago. 2017.

MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. 1576 p.

MENDONÇA, Maíra; SILVA, Rafael. Soldado da PM faz live da própria prisão em Cachoeiro de Itapemirim. Gazeta Online, 17 jun. 2017. Disponível em: <http://www.gazetaonline.com.br/noticias/cidades/2017/06/soldado-da-pm-faz-live-da-propria-prisao-em-cachoeiro-de-itapemirim-1014066865.html&gt; Acesso em: 22 ago. 2017

NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Militar comentado. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014. Disponível em: <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/books/978-85-309-5715-5/epubcfi/6/50%5B;vnd.vst.idref=pt02chapter02%5D!/4/238/6@0:100&gt;. Acesso em: 22 ago. 2017.

QUINTIERE, Victor Minervino. Intimidade VS. Liberdade de Expressão: os critério axiológicos na jurisdição constitucional brasileira. Belo Horizonte: D’Plácido, 2016. 194 p.

SENRA, Ricardo. PM tem prisão decretada após criticar corporação em comentário no Facebook. BBC Brasil, São Paulo, 27 set. 2016. Disponível em: <http://www.bbc.com/portuguese/brasil-37478930&gt; Acesso em: 22 ago. 2017.

UNITED STATES OF AMERICA. Constituição (1789). Constitution Of The United States. Disponível em: <https://www.senate.gov/civics/constitution_item/constitution.htm&gt;. Acesso em: 19 ago. 2017.

[1] Bacharel em Administração de Empresas pela UCB – Universidade Católica de Brasíla, bacharelando em Direito pelo UniCEUB – Centro Universitário de Brasília, e membro do escritório Bruno Espiñeira Lemos & Quintiere Advogados.

[2] Mestre em Direito pelo Instituto Brasiliense de Direito Público – IDP. Membro da Comissão de Assuntos Constitucionais da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional de Brasília – CAC/DF. Sócio do escritório Bruno Espiñeira Lemos & Quintiere Advogados. Professor universitário. Consultor jurídico da Rádio Justiça.

[3] A livre comunicação das ideias e das opiniões é um dos mais preciosos direitos do homem; todo cidadão pode, portanto, falar, escrever, imprimir livremente, respondendo, todavia, pelos abusos desta liberdade nos termos previstos na lei (FRANÇA, p.1, tradução nossa).

[4] O congresso não deverá fazer qualquer lei a respeito de um estabelecimento de religião, (…), ou restringindo a liberdade de expressão, ou da imprensa (…) (ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA, 1791, p.17, tradução nossa).

[5] Todos têm o direito de expressar e divulgar livremente a sua opinião por via oral, por escrito e por imagem, bem como de informar-se, sem impedimentos, em fontes de acesso geral. A liberdade de imprensa e a liberdade de informar através da radiodifusão e do filme ficam garantidas. Não será exercida censura (Alemanha, 1949, p.2, tradução nossa).

[6] Art. 5º, IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;

Art. 5º, IX – é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;

Art. 5º, XIV – é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional;

Art. 220, caput – a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

Art. 220, §1º – nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV. (BRASIL, 1988)

[7] ADPF 187 de 15-6-2011, Rel. Min. Celso de Mello, e a ADI 4.274 de 23-11-2011, Rel. Min. Ayres Britto.

[8] Art. 42 Os membros das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares, instituições organizadas com base na hierarquia e disciplina, são militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios.

[9] Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.

[10] HC 75676 de 12-05-1998, Rel. Min. Sepúlveda Pertence.

[11] Apelação Cível nº 1000259-76.2016.9.21.0000 de 14-12-2016, Rel. Juiz Amilcar Fagundes.

Tenha acesso ao artigo em PDF (Artigo sobre a liberdade de expressão na polícia militar e nas redes sociais)

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Índice de criminalidade baixa na Cidade Estrutural

Um policiamento inteligente é baseado em três pilares: eficiência, eficácia e efetividade das ações policiais, tendo como base os anseios da comunidade. Falar neste tipo de policiamento é falar em: política inteligente, liderança inteligente e gestão inteligente, ou seja, em ações rápidas e baratas para o contribuinte.

Também é falar em policiamento comunitário, por meio de um policiamento orientado para o problema e ações coletivas e individuais visando melhorar o policiamento e a sensação de segurança para a comunidade.

O 15º BPM (Batalhão da Estrutural), inaugurado em janeiro de 2017, comandado pelo Major Fabiano, juntamente com suas equipes de área, aos poucos tem dado uma cara diferente ao policiamento da cidade Estrutural, no Distrito Federal.De perfil tranquilo, de fácil diálogo e conciliador, o comandante tem imposto seu ritmo.

Tudo isso, agregado ao perfil do novo Administrador Pastor Melquesedeque Portela, um gestor inteligente e hábil que tem colocado em prática certos conceitos. Não é atoa que os índices de criminalidade estão caindo na cidade.

O policiamento comunitário é uma estratégia de policiamento extremamente progressista e inovadora, quando feita da forma correta.

O diálogo com a comunidade e o tratamento respeitoso é uma das formas eficientes e eficazes de se obter resultados. Ganhando a confiança da comunidade, ela passa a ser uma grande aliada da polícia. É o que está acontecendo na Cidade Estrutural.

No último domingo (06/06) uma das grandes reclamações da comunidade era o excesso de veículos parados em frente ao terminal rodoviário da cidade. O que fazia com que usuários do sistema perdessem os ônibus, ou que os coletivos tivessem que parar no meio da via, prejudicando a fluidez e trazendo insegurança.

Nesse mesmo dia uma grande operação comandada pelo coordenador de policiamento urbano, Tenente Jônatas, retirou duas armas de circulação.

A polícia militar, por meio das equipes de área, foi acionada e procurou resolver a situação da melhor forma possível. Orientou os usuários sobre seus direitos, dialogou com os fiscais e motoristas do terminal e notificou os veículos irregulares, removendo alguns que os proprietários não foram encontrados.

Após o ato educativo, durante a semana, um sargento do Batalhão, chamado de adjunto, desloca-se ao terminal pela manhã, ao entrar de serviço, e orienta os fiscais e motoristas para estacionarem os ônibus nas vagas destinadas a eles em frente o terminal, assim, as vagas não ficam ociosas e os motoristas desavisados não estacionam em local proibido.

Ao saber do fato, o administrador da cidade, Pastor Melquesedeque, após fazer um curso de polícia comunitária, ministrado em parceria com a Secretaria de Segurança Pública, dentro do Projeto Viva Brasília, resolveu aplicar o que aprendeu sobre a teoria das janelas quebradas, que diz que “a sensação de abandono tende aumentar o abandono” e logo solicitou ao Detran que revitalizasse a sinalização horizontal do local e mandou pintar os meios feios.

Dando assim, uma sensação diferente ao local. Em três dias tudo foi resolvido, sem burocracia excessiva e jogo de empurra. Desta forma, quem ganha é a comunidade.

Na filosofia de policiamento inteligente entende-se que as pequenas incivilidades geram as grandes e que a mediação de conflitos pode solucionar grandes problemas. A interação entre polícia, comunidade e agentes políticos podem trazer grandes resultados para os contribuintes. É a coisa pública sendo gerida de forma eficiente, eficaz e efetiva, da forma que tem que ser.

Fonte: Blog Policiamento Inteligente 

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Crimes de opinião versus crimes contra o cidadão nas corporações policiais

A relação entre as polícias e a comunidade tem sido objeto de debate nas sociedades democráticas. As instituições policiais, segundo Bayley (1975) – estudioso do tema, são aquelas organizações destinadas ao controle social com autorização para utilizar a força, caso necessário. Confesso que sempre tentei entender o tal do “monopólio do uso da força”, especialmente nos dias atuais.

Quando analisamos as polícias nos regimes democráticos, percebemos que a atividade policial requer um equilíbrio entre o uso da força e o respeito aos direitos individuais. Assim, podemos afirmar que a especificidade da atividade policial nos regimes democráticos é a necessidade de limitar e administrar o uso da força legal, sem abrir mão de suas prerrogativas de controle social. E quando ouço falar de “uso da força legal”, poderia ampliar para as “forças simbólicas internas”, inclusive nas questões de cunho administrativo. Por isso, em alguns casos, defendi o controle de constitucionalidade externo do Ministério Público nas sindicâncias nas polícias, sejam elas militares ou civis.

Nos últimos anos, diversos países têm enfrentado o desafio de limitar e controlar o uso da força legal. Basicamente, os esforços se concentraram, segundo trabalhos realizados pela minha ex-professora: Maria Stela Grossi Porto,  da Universidade de Brasília, em especial, sobre Condutas Policiais e Códigos de Deontologia, na criação de mecanismos institucionais de responsabilização e controle da atividade policial.

Entretanto, segunda Stela Grossi, a qualidade e eficácia desses mecanismos, que visam a inibir a violência policial, são questões ainda pouco problematizadas tanto no interior das próprias polícias quanto fora delas, pelos pesquisadores. Além de fatores internos à organização policial, a análise e a compreensão de tais questões passam, igualmente, pelas relações entre polícia e sociedade.

Neste sentido, alguns estudos internacionais buscaram entender os padrões de relacionamento entre a polícia e a sociedade (Bayley, 1994; Geller e Toch, 1996, Skolnick e Fyfe, 1993; Monjardet, 2003), e dois temas têm sido destacados: as formas de reforçar os vínculos entre a polícia e a comunidade e a necessidade de controlar a atividade das polícias.

Após ler alguns estudos, surgiu o interesse de minha parte em me aprofundar neles, quem sabe por meio de um mestrado, tenho refletido sobre minha própria experiência de “punições” por publicações aqui no Blog e em minha página pessoal no facebook, onde de forma muitas vezes arbitrárias tenho sido punido e recorrido a justiça.

Tais punições e estudos sobre a violência policial tem me instigado a investigar boletins internos e do comando para produzir um trabalho sobre o foco da corporação no controle de seus membros e a legitimação da violência institucional. Neste caso, o reforço institucional da violência, em procedimentos administrativos /IPM`s, assim como nas páginas da corporação do Ethos guerreiro, ao cultuar os grupos táticos e os perfis policiais de caráter mais “armamentistas”.

Tenho me aprofundado sobre a dosimetria das punições, em especial se ela existe, ou se ela é totalmente subjetiva, ao bel prazer dos julgadores. O interesse veio após ver artigos do RDE semelhantes com punições totalmente diferentes. Minha pretensão é comparar as punições de caráter político/ideológico, que chamo de “crimes de opinião” na corporação, com os crimes de violência policial contra o cidadão e chegar a uma conclusão.

A primeira que quero avaliar é se a violência é legitimada institucionalmente e a segunda é aferir até que ponto existe uma proporcionalidade entre as punições de “crimes” e “transgressões disciplinares” de atos violentos e os “crimes e transgressões” de opiniões de policiais. Avaliar se existe dosimetria da “pena” e quais punições seriam adequadas aos julgadores que ferirem princípios constitucionais como por exemplo o princípio da proporcionalidade e da impessoalidade.

Além disso, até que ponto tais punições não ferem direitos individuais e portanto ferem direitos humanos, convenções e tratados nacionais e internacionais, como já ocorreu no passado, e com tudo isso, a possibilidade de poder ser revertido em danos morais  aqueles que sofreram tais perseguições e ainda sofrem dentro da Corporação. O controle externo do Ministério Público e de órgãos internacionais é fundamental neste momento. As corporações policiais precisam mudar, em especial, na adequação ao Estado Democrático de Direito e suas regras.

Para compreender melhor o tema discutido aqui sugiro duas leituras: Condutas policiais e Códigos de Deontologia, dos meus ex-professores: Arthur Trindade Maranhão Costa e Maria Stela Grossi Porto e o Livro de outro amigo, o Advogado Dr Victor Minervino Quintiere, que inclusive me ajudou a ser absolvido em um IPM por publicação aqui no blog: Intimidade vs. Liberdade de expressão: Os critérios axiológicos na jurisdição constitucional brasileira.

Liberdade de expresão

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