Transformar uma escola pública tradicional em uma “escola cívico militar” não é um trabalho fácil, pois exige paciência, tempo, dedicação e acima de tudo conscientização. Não é pela força, nem impondo regras que as mudanças virão. Elas passam pela mudança de mentalidade que gera a mudança de comportamento.
Neste processo sensível de construção do compartilhamento de uma Gestão Escolar, na qual se tem duas direções, sendo uma pedagógica/administrativa e outra disciplinar, alinhar o pensamento entre gestores é um grande desafio, maior ainda repassá-las aos demais membros da comunidade escolar. A mobilização interna e externa torna-se extremamente necessária.
O primeiro ponto que é preciso compreender é que trazer um modelo como alternativa ao tradicional é um verdadeiro processo de democratização do ensino. Grande parte das escolas militares estão em grandes centros, com regras para ingresso extremamente difíceis. Criar escolas cívico-militares em regiões com índices elevados de criminalidade e baixos níveis de indicadores escolares é dar oportunidade para aqueles que possivelmente nunca teriam a possibilidade de estudar em uma escola assim. Tais escolas ao final irão representar no máximo 1% das escolas tradicionais em algumas comunidades.
Temos utilizado os seguintes critérios na construção de uma escola cívico-militar no DF:
1ª FASE – Conscientização (quebra de preconceitos por meio de novos conceitos);
Para que um novo hábito se estabeleça são necessários pelo menos 21 dias seguidos de ações, o que exige disciplina e persistência. (Abaixo cada cor representa 21 dias totalizando 63 dias, após isso, é necessário sair da visão cartesiana e passá-lá para uma sistêmica onde todas as pirâmides se conectam em processo de construção diária).
Recompensas e punições diárias reforçam os hábitos
“Nós devemos criar as nossas recompensas quando as atividades que nos comprometemos a iniciar não são recompensadoras em si.”
2ª FASE – Metodologia (o que fazer, como fazer e quem mobilizar);
Alguns passos nesta direção:
– É preciso definir claramente o resultado (mudança de comportamento, por exemplo);
– É preciso encontrar uma forma de se cobrar ou de ser cobrado pela ação.
– É preciso começar pequeno e focado: inclua na rotina um hábito por vez.
3ª FASE – Ações individuais e coletivas (planejamento orientado para o problema).
– É preciso identificar e focar naqueles que inicialmente queiram criar o hábito e que acreditam no projeto.
– As conversas individuais com os alunos mais resistentes são necessárias para conscientizar e orientar, da mesma forma com aqueles que são parceiros no projeto. Os apoiadores devem ser potencializados e multiplicados.
– As formaturas matinais servem para orientar e fortalecer as ações coletivas.
– Planeje um tempo determinado para ordem unida individual com os Chefes de Turma e depois com o grupo.
MOBILIZAÇÃO INTERNA E EXTERNA
Na primeira fase grande parte das advertências e medidas disciplinares estão voltadas para atrasos, uso de brincos e piercings, bermudas, calças rasgadas, uso de celular em sala de aula, não fazer o dever de casa e desrespeitos diversos. Questões que dependem mais da colaboração da família do que da polícia e da escola. É preciso conscientizar os pais de seu papel na escola e de sua importância no projeto. Por outro lado, alguns pontos necessitam da participam efetiva do professor em sala de aula e da autuação diária dos monitores no combate a pequenas transgressões da disciplina.
O QUE TEMOS ENSINADO E COBRADO?
O QUE BUSCAMOS NESTE MOMENTO?
A padronização e a uniformização estão alicerçadas na norma, mas como o hábito leva em média 21 dias para ser incorporado, os dois primeiros são feitos de forma gradual. Padronizar leva tempo e exige repetição com correção. É preciso compreender que a uniformização é coletiva, já a padronização passa pelo individual. Um aluno “padrão” deve ser um exemplo a ser seguido. É preciso dar-lhe um reforço positivo.
O QUE ALMEJAMOS PARA O FUTURO?
A colocação dos monitores em cadeiras em pontos estratégicos para controlar a movimentação dos corredores é o primeiro passo na redução da movimentação de alunos nos corredores. A presença do monitor ajuda na construção do hábito, afinal ele precisa ser lembrado, dentro de uma rotina que gera punições e recompensas. Consequentemente, com os alunos em sala de aula, surge a necessidade da participação da equipe pedagógica, em especial, o professor em sala de aula na construção de uma escola silenciosa. A diminuição do fluxo de alunos nos corredores e a delimitação de áreas para a alimentação por si só começa a contribuir para uma escola mais limpa. A conscientização para se evitar a reprodução da “cultura do lixo” na cidade fortalece a ideia de que a escola pertence a todos, por isso precisa ser bem cuidada.
COMO FUNCIONA A FORMAÇÃO DO PENSAMENTO PARA CHEGAR À CONSCIENTIZAÇÃO
(P + P + S + A = R)
O Hábito pode ser entendido como um padrão consistente de comportamento, uma inclinação por alguma ação ou disposição de agir constantemente de certo modo, adquirida pela frequente repetição de um ato. É algo que se faz regular e automaticamente. A repetição intencional de novos pensamentos, percepções e principalmente de ações em determinadas situações passam a ser assimiladas diariamente, após iniciada, à medida que estas repetições de novos hábitos acontecem passam a ser incorporadas pelo pensamento e se tornam novos hábitos, automáticos. Isso ocorre por causa da tendência natural do cérebro de querer economizar energia.
QUE AÇÕES ESPERAMOS DOS ALUNOS A LONGO PRAZO:
1 – Mudança de mentalidade;
2 – Mudança de comportamento;
3 -Que se tornem honrados cidadãos!
Todo hábito tem um gatilho disparador que o antecede e uma recompensa final. Para que a mudança de hábito tenha sucesso, é necessário identificar estes dois mecanismos.
Identificar e modificar um hábito é a porta de entrada para um novo padrão de comportamento com novos vários hábitos.
O QUE ESTAMOS TRABALHANDO NESTE MOMENTO?
O respeito é ensinado e cobrado, mas percebe que os “filhos tendem a repetir os erros dos pais em maior ou menor proporção”, sendo assim, a mobilização dos pais no processo de construção do pensamento, que irá gerar a mudança de mentalidade e do comportamento, é fundamental. A uniformização, inicia o processo de padronização.
O diagnóstico é necessário para compreender o cenário. A partir dele formulam-se projetos e ações específicas para a sua implementação. A avaliação em um primeiro momento acaba sendo diária, pois no início quase tudo funciona na lógica de “erros e tentativas”.
As punições devem seguir uma lógica. De início, haverá uma cobrança pelo “endurecimento” das regras dentro da escola. Algo que funciona em um primeiro momento, mas como não se cria o hábito, logo se torna cíclica, ou seja, quando se “arrocha” há resposta, quando folga um pouco na cobrança tudo volta ao que era antes, mas quando aliado a punição existe a conscientização, a mobilização dos pais e professores para auxiliarem no processo de construção da nova “mentalidade”, como consequência ocorrerá a mudança de comportamento esperada.
Por Aderivaldo Cardoso – Pós Graduado em Segurança Pública e Cidadania pelo Departamento de Sociologia da Universidade Brasília. Atualmente é Supervisor Disciplinar em uma Escola Cívico-Militar no DF.