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Câmeras de vigilância: são realmente importantes na segurança pública?

Confesso que hoje falaria de outro assunto. Iria falar sobre eficiência, eficácia e efetividade das ações policiais, tendo como base os anseios da comunidade. Iria discorrer, lógico que dentro do meu ponto de vista, do porquê a Polícia Militar do DF tem cada vez menos efetivo e tem “produzido” cada vez mais. Iria falar de um dos Princípios de Pareto, em que “menos é mais”.  Só que ao ler a manchete do Jornal Correio Braziliense de hoje: “O BBB ESTÁ MÍOPE“, reportagem da queridíssima Isa Stacciarini, mudei de ideia.

A página 19, do Caderno Cidades, do jornal do dia 09/01/2018 (terça-feira), trouxe o tema: “Câmeras que não veem“. A chamada afirma que “a capital que chegou a ser chamada de Big Brother Brasília, em 2014, graças a um moderno sistema de monitoramento eletrônico, hoje enfrenta o sucateamento e a falta de instalação de novos equipamentos.” No Correio Eletrônico leia a matéria com o título: “Das 453 Câmeras de vigilância no DF, apenas 70 estão funcionando.”

O tema é interessante porque no mesmo jornal datado de 06/01/2018 (sábado) o Secretário de Segurança fez o seguinte comentário: “Quando se trabalha o policiamento integrado e estratégico, com uso de tecnologias e estatísticas para direcionar as atividades, a criminalidade cai e paralelamente o bem-estar da população aumenta. É isso que vem acontecendo nos últimos anos.”

Ao ler as aspas do Secretário a primeira pergunta que veio a minha mente foi: quais tecnologias? Nosso sonho sempre foi a unificação de bancos de dados das polícias, o que realmente traria bons resultados, mas infelizmente perdemos a batalha. Fiz tal pergunta porque sei da capacidade do Prof. Marcelo Durante e sua equipe, no que diz respeito aos indicadores de segurança pública e das tabelas que constituem as estatísticas oficias, afinal fui seu aluno e conheço grande parte da equipe que atua na SSP, não mudou muito de quando estive lá.

Voltando as Câmeras, me lembro bem que no início de 2015, quando eu era Assessor Especial de Gabinete, e levamos um susto quando nos deparamos, na parte lateral do Detran, em um estacionamento aos fundos, com uma grande quantidade de caixas deteriorando com o passar do tempo. Para nossa surpresa tratava-se de várias câmeras  de vigilância que deveriam ser colocadas em funcionamento na época da copa do mundo. Além disso, existia uma grande pressão por parte da empresa responsável pela manutenção dos equipamentos, mas voltemos a reportagem…

A matéria nos mostra a memória de tal discussão, que remonta ao ano 2000 seu início. De lá para cá vários governos passaram. “As câmaras de vídeo e os equipamentos eletrônicos espalhados pelo DF deram o título de Big Brother Brasília à capital federal” era um dos títulos de uma matéria de 2004 que mostrava que, à época, era tanta vigilância que a Secretaria de Segurança Pública informou que não tinha estimativa de quantas câmeras existiam na capital federal. Fato que demonstra a veracidade da fala do Prof. George Felipe Dantas que afirmou que “parece que existem problemas de gestão que impendem que essa ferramenta importante seja de fato implementada.” Fato semelhante ocorreu com o projeto dos Postos Comunitários de Segurança Publica, que foi contemporâneo da evolução das câmeras no DF, tanto é que se dizia que cada posto teria uma câmera que iria monitorar uma parte da região ao seu redor. Infelizmente dinheiro do contribuinte sendo jogado no lixo.

Segundo o Correio “fevereiro de 2012, 37 câmeras começaram a funcionar no coração de Brasília. O projeto fazia parte de uma iniciativa maior do Governo do Distrito Federal, em parceria com o Governo Federal, que pretendia instalar 900 câmeras no prazo de quatro anos.” Ainda segundo a matéria “no primeiro momento, o investimento foi de R$ 790 mil, incluindo a instalação e a montagem da central de monitoramento. Todo o projeto ficou orçado em R$ 18 milhões.” Além do Plano Piloto, 17 regiões administrativas ficariam sob monitoramento, como Taguatinga, Ceilândia e Sobradinho. A expectativa era chegar em 2013, para a Copa das Confederações, com quase 100% das 900 câmeras instaladas. O que aconteceu? Alguém será responsabilizado? E o Ministério Público como fiscal do Estado?

O grande problema das políticas públicas, principalmente de segurança pública e saúde pública, é que elas não existem. Muita coisa é feita com base no achismo. Outras são de má fé mesmo, pois ao invés do responsável pelo projeto perguntar: como essa política vai beneficiar a população? A pergunta que se faz é: Como irei me beneficiar com essa compra? Quantos por cento irei ganhar? A corrupção e a omissão, que não deixa de ser um tipo de corrupção, não estão deixando nosso país andar. Os gestores que avalizam tais projetos deveriam ser responsabilizados e condenados a devolver o dinheiro público. Regras mais rígidas para o controle dos recursos públicos deveriam ser implementadas.

O lobby nas áreas de segurança pública e saúde pública são muito grandes. Empresas de tecnologia sobrevoam as secretarias como “urubus procurando carniça”. Quem esteve nos bastidores saberá bem do que estou falando. Não dá mais para ficarmos de olhos vendados vendo o “teatro” do “faz de conta” nos serviços públicos. Governos passam, as polícias permanecem e pagam um preço alto por causa de gafanhotos políticos (agentes transitórios) que destroem tudo por onde passam, comendo o dinheiro público e deixando os estragos para que os “agentes permanentes” paguem o preço da incompetência estatal. Não sou contra  a tecnologia na segurança pública, sou contra projetos mirabolantes que derramam pelo ralo o dinheiro público que poderiam, por exemplo, ser investido nos profissionais que sustentam o estado evitando que ele caia de uma vez.

Um prática que precisa ser banida da segurança pública é aquela em que empresas dão “amostra grátis” de seus produtos. Os governantes fazem propaganda como se estivessem lançando um grande pacote de bondades, mas depois não contratam as empresas, por diversos motivos, e tais “amostras” são retiradas de uma hora para outra. Vi isso acontecer várias vezes em vários níveis do serviço público e até mesmo em condomínios privados. Em setembro de 2013 fiz as mesmas indagações.  É algo que somente contribui para a proliferação da corrupção e para o péssimo serviço público em nosso país. Somos todos responsáveis pela melhoria da segurança pública.

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Por Aderivaldo Cardoso – Jornalista – Especialista em Segurança Pública e Cidadania – Pós graduado em Segurança Pública e Cidadania pelo Departamento de Sociologia da Universidade de Brasília. Autor do Livro: Policiamento Inteligente – Uma análise dos Postos Comunitários de Segurança Pública e Cidadania –  Editora MG – 2011 – Ex-Assessor Especial de Gabinete da SSPDF e ex-Assessor Especial de Comunicação da Assessoria de Comunicação Social da SSPDF.

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96% dos policiais militares se aposentam antes dos 50

Entres as categorias de servidores estaduais com direito à aposentadoria especial, a que mais chama a atenção é a dos policiais militares, os PMs. Na média, 96% se aposentam antes de completar 50 anos, segundo estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Entre os policiais civis, essa parcela cai para 75%. É ainda menor entre professores: 64% do total deixam a sala de aula antes dessa idade. As entidades que representam os PMs concordam que é cedo para deixar a farda, mas explicam que para prolongarem o tempo de serviço é preciso reestruturar as carreiras na corporação.

Dois fatores básicos seriam responsáveis pela precocidade nas aposentadorias da PM, segundo os próprios integrantes. O primeiro é que a maioria trabalha nas ruas, no corpo a corpo diário com a violência, diz o cabo Wilson Morais, presidente da Associação dos Cabos e Soldados da Polícia Militar do Estado de São Paulo. Pelas conta de Morais, quase 80% do efetivo está na linha de frente, sem alternativa de migrar para um escritório quando ficam mais velhos.

A segunda razão é que há várias regras limitando a permanência. Cada Estado tem uma regra para a aposentadoria na PM e ela costuma variar conforme a patente. Em São Paulo, soldados e cabos se aposentam com 30 anos de contribuição ou aos 52 anos. Se não, vem a aposentadoria “expulsória”. Devem sair, quer queiram ou não – e a maioria quer, mesmo “amando” a PM, diz Morais. “Imagine que a sua vida é ficar na viatura, na rua, atrás de marginal, dia e noite, faça calor, frio ou chova, vendo colegas morrendo e você, matando. Deu 30 anos, estão doidos para ir embora e, como a maioria entra cedo, isso pode acontecer antes dos 50.”

Várias outras regras levam à aposentadoria precoce. Morais se aposentou aos 44 anos porque se elegeu deputado – militar na ativa não pode ter cargo público. Mas ele se considera um privilegiado por outro aspecto. “Eu entrei na PM em 1975, numa turma de 44 colegas. Estou com 62 anos. Sabe quantos estão vivos? Sete, comigo.” Segundo Morais, muitos PMs morrem antes dos 50 anos, em serviço. Alguns vivem mal porque não aguentam a pressão. Começam a beber ou usar drogas ainda na ativa, perdem produtividade e pioram na aposentadoria. “O PM passa a vida na rua, pela corporação ou fazendo bico, porque ganha mal, e quando para não aguenta ficar em casa, acaba no bar e morre cedo”, diz.

Projeto. Para aliviar o déficit da Previdência de São Paulo, que já bateu em R$ 17 bilhões, segundo levantamento do Ipea, o governo do Estado tenta criar uma alternativa para prolongar a permanência dos PMs. Em fevereiro, o governador Geraldo Alckmin encaminhou à Assembleia Legislativa o projeto de lei que dá a opção de ficar na ativa até os 60 anos, mas em funções administrativas. “Como a ampliação do tempo pode garantir aposentadoria integral e a proposta é opcional e para cargo administrativo, a gente apoia – se fosse obrigatória ou para manter o cara na rua até 65 anos, o que seria desumano, iríamos contra”, diz Morais.

Em cargos superiores, as idades – e limitações – são outras. Sargentos e subtenentes trabalham até os 56 anos. Tenentes e coronéis, até os 60 anos. Com um detalhe no topo: a aposentadoria é obrigatória cinco anos após o PM ser promovido a coronel. São Paulo tem um bom exemplo. Em março, tomou posse como comandante da PM o coronel Nivaldo Restivo, de 52 anos de idade, mas 35 de serviços prestados em funções sofisticadas, como dirigente da Rota e do Gate. Como foi promovido a coronel em 2013, deve se aposentar no ano que vem.

“Não sei se a corporação vai gostar do que vou dizer, mas penso assim, a PM perde os seus talentos com as regras atuais. Oficias bem formados, que poderiam estar em funções de gestão, se aposentam cedo e vão atuar em empresas privadas”, diz capitão Marco Aurélio Ramos de Carvalho, vice-presidente da Associação dos Oficiais Militares de São Paulo.

Para ele, a PM foi “uma família”. “Tudo que tenho devo à corporação: entrei com uma mão na frente outra atrás, como dizem no interior.” Fez Educação Física e Direito. Cumpriu o tempo previsto e saiu. Prestou concurso e entrou no Ministério Público, onde se aposentou. Ainda hoje, aos 70 anos, advoga. “Poderia estar contribuindo com a PM até agora.”

Carvalho se preparou para participar das negociações da reforma da Previdência e ficou surpreso quando os servidores estaduais foram excluídos. “Era melhor a gente negociar uma forma de a corporação aproveitar a experiência de quem está dentro e, ao mesmo tempo, resolver o problema da Previdência, porque não tem jeito: a gente vive mais e não há caixa que aguente isso.”

Na associação, há vários exemplos de longevidade. O presidente, coronel Jorge Gonçalves, fez 87 anos na sexta-feira. Dizem que é imbatível na sinuca. Todas as tardes, vários reservistas se reúnem para jogar dominó. O tenente Abel Barroso Sobrinho, de 85 anos, é presença cativa. Se aposentou aos 51 anos, com 30 de serviço. Está há 34 anos na reserva. Fez a segunda carreira na arbitragem de futebol – onde atua até hoje. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Fonte: Estadao Conteudo

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Governador encaminha proposta de alteracão em promocões de oficiais QOPMA

Está nos sites da PMDF e do CBMDF uma notícia que surpreendeu muita gente. Eu particularmente acho uma atitude justa e que merece elogio ao governador, caso a medida provisória seja aprovada no congresso. A antiguidade é o melhor caminho, mas no momento ela beneficiaria uma minoria. O caminho mais justo e equilibrado é aquele onde beneficia antigos, mas não mata as esperanças dos mais novos. Sou a favor de todos os mecanismos que venham a dar maior fluidez em nossa carreira. 50% das promoções por antiguidade, neste momento, e 50% delas na “caneta”, por meio de provas, é o mais equilibrado.

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Segue a nota da PMDF na íntegra:

Alteração no processo de promoção para oficiais dos quadros Administrativos, Especialistas e Músicos da PMDF e do CBMDF.
 Devido às atuais discussões sobre o tema no Congresso Nacional e atendendo ao anseio da Polícia Militar do Distrito Federal e do Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal, o governador do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg, encaminhou hoje (24), proposta de medida provisória alterando o processo de promoção para oficiais dos Quadros de Administração, Especialistas e Músicos.
 Amplamente discutida, desde o advento da comissão de reestruturação das carreiras, com representações de oficiais e praças das corporações, a proposta modifica apenas, e de forma isonômica, os critérios de antiguidade e merecimento, estabelecendo 50% das vagas para cada uma das formas de ascensão profissional.
 Com a aprovação da medida provisória proposta, será possível colher os benefícios de ambos os sistemas, motivando tanto os militares mais antigos a permanecerem na ativa e a progredirem na carreira, quanto incentivar o preparo intelectual contínuo daqueles que pretendem concorrer às vagas abertas nos citados quadros, além de oxigenar e permitir uma melhor fluidez das carreiras.
Panfleto (1)

Sendo possível este caminho por meio de uma MP (Medida Provisória)  o governo também poderia ver a possibilidade para ampliar as vagas da graduação de subtenentes em mil vagas e o Quadro de Oficiais  Administrativos em pelo menos cem vagas.  O ideal seria a promoção por tempo de serviço, onde o soldado possa chegar a classe especial da carreira em 15 anos semelhante ocorre em outras carreiras do DF, mas se não for possível, a ampliação das vagas já gera a fluidez necessária para que a maioria chegue ao final da carreira a graduação de subtenente. Além disso, poderia também tornar obrigatória a promoção,  retirando da lei 12.086/09, o “poderá” promover e colocando no texto da lei o “deverá” promover.

Saiba mais sobre o que pensamos sobre o tema: Fluidez na Carreira. Eis o caminho para uma polícia cada vez mais de Estado e cada vez menos de “governos”. Uma polícia forte é uma polícia mais eficiente!

Fonte: Site PMDF

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Câmara Federal aprova prorrogação da promoção por antiguidade na PMDF por 15 anos

O Plenário da Câmara dos Deputados aprovou nesta segunda-feira (17) a  Medida Provisória 737/16, que permite aos militares inativos dos estados e  do Distrito Federal atuarem na Força Nacional, com o objetivo de reforçar a segurança pública em situações excepcionais. A matéria será analisada ainda pelo Senado.

Os deputados aprovaram também emenda dos deputados Rôney Nemer (PP-DF), Alberto Fraga (DEM-DF) e Larte Bessa (PR-DF) que aumenta de 5 para 15 anos o prazo para aplicação do critério de antiguidade para as promoções de subtenente a segundo tenente QOPMA. Desta forma, neste período não serão aceitos concursos internos para acesso ao quadro de oficiais administrativos. A carreira neste período irá de soldado a major!

ÍNTEGRA DA PROPOSTA:

MPV-737/2016
Reportagem – Eduardo Piovesan

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Entenda mais sobre a necessidade de fluidez na carreira: clique aqui

Com informações Agência Câmara Notícias.

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Redução da produtividade policial no ano em 5,4% seria resultado da greve da polícia civil?

pcdfA reflexão de hoje é inspirada em um dos “eixos indicadores” do Pacto Pela Vida no DF: 4. Produtividade Policial. É um daqueles textos chatos e “teóricos” que só merecem ser lidos por quem entende ou simplesmente por quem gosta de compreender o tema segurança pública e os problemas que envolvem a polícia no Brasil e no mundo. Se você é um prático, que acha que entende tudo de polícia e que “policiólogos” e “teóricos” são uns “merdas”, este texto não merece ser lido por você. Este texto é seletivo, é somente para quem realmente gosta de ler, pois ele é grande e tem um tempo estimado de leitura de 6 (seis) minutos.

BITTNER (2003) ao escrever sobre os Aspectos do trabalho policial, em especial as funções da polícia na sociedade moderna, nos afirma que:

“O abandono, na definição do papel da polícia na sociedade moderna, da abordagem derivada  das normas, imediatamente chama a atenção para um nível da realidade social que não está relacionada a formulação de ideias. Embora (em termos destas formulações) a atividade policial derive seu significado dos objetivos de cumprimento da lei, achamos que, na realidade, há certas características significativas associadas ao trabalho policial que são bastante independentes dos objetivos. Isto é, o trabalho policial geralmente é visto como tendo traços de caráter que são dados como certos, e que, em ambos os lados controlam interações entre policiais e cidadãos.”

Para ele, algumas características da polícia, observadas mundialmente, constitui um “limite realista do que se espera da polícia e de como os policiais de fato se comportam”. Ao discorrer sobre as concepções populares sobre o caráter do trabalho policial um ponto chama-nos a atenção entre “os traços de caráter comumente percebidos como associados ao trabalho policial – e que, desse modo, constituem em parte a realidade social na qual o trabalho tem que ser realizado” – são de importância primordial os três a seguir: o trabalho policial é uma ocupação corrompida, o trabalho policial não é apenas uma ocupação corrupta e a distribuição ecológica do trabalho policial, concentrada no nível de emprego determinado pelos departamentos e nos termos das orientações dos policiais individuais, reflete toda uma gama de preconceitos públicos. Isto é, a polícia é mais fácil de ser encontrada em lugares onde se encontram ou vivem certas pessoas do que em outras partes da cidade, por isso nosso interesse no Eixo 4 – Produtividade policial, do Pacto Pela Vida.

1 – O trabalho policial é uma ocupação corrompida – As origens do estigma foram criadas no passado distante, e embora muito tenha sido dito e feito para apagá-lo, tais esforços têm sido notavelmente mal sucedidos.

“O vigia medieval, recrutado entre as camadas dos destituídos e sujeito a descrições satíricas, era considerado pertencentes ao mundo das sombras, que se supunha que eles controlavam. Durante o período da monarquia absoluta a polícia passou a representar os aspectos subterrâneos da tirania e da repressão, e os policiais eram desprezados e temidos mesmo por aqueles que ostensivamente se beneficiavam de seus serviços. […]. Outras razões levam em conta principalmente as circunstância de que o trabalho policial é uma ocupação com baixa remuneração, cujas exigências podem ser cumpridas por homens que receberam pouca instrução formal. E alguns, finalmente, a partir de abusos dos relatos sobre abusos policiais, generalizam tais abusos para a ocupação como um todo.” (BITTNER, 2003)

Poucas coisas mudaram de lá para cá nestes aspectos. Ao ver os dados da Secretaria de Segurança Pública no DF é perceptível que a polícia, tanto civil, quanto militar, trabalham muito. Mas trabalhar muito não significa ser “eficiente”, “eficaz” e “efetiva”. Os números também demostram isso. Trabalhadores braçais, ganham pouco e trabalham muito, se sobrecarregam às vezes excessivamente, por não terem as ferramentas necessárias para executarem um bom trabalho ou simplesmente por não saber operar as “ferramentas” que estão disponíveis para eles. A falta de efetividade nas ações potencializam a visão generalista que a população tem da polícia.

Os Eixos Indicadores do Pacto Pela Vida no DF, me recuso chamar tal programa de “Viva Brasília”, se referem aos crimes prioritários para serem reduzidos, e que não estão conseguindo reduzir, diga-se de passagem,  são quatro:

  1. C.V.L. I – Crimes Violentos Letais Intencionais, que abarca o homicídio, o latrocínio e a lesão corporal seguida de morte;
  2. C.C.P – Crimes contra o Patrimônio, que abarca o roubo a transeunte, roubo de veículo, roubo em transporte coletivo, roubo em comércio, roubo em residência e furto em veículo.
  3. OUTROS CRIMES – Onde focam em três, basicamente: tentativa de homicídio (que ao meu ver deveria constar no rol do C.V.L.I), tentativa de latrocínio (que também ao meu ver deveria constar no rol do C.V.L.I) e Estupro.
  4. PRODUTIVIDADE POLICIAL – que abarca o Tráfico de Drogas, o Uso e Porte de Drogas, Posse/Porte de Arma de Fogo e Localização de Veículo furtado ou roubado.

É fato na literatura mundial que o trabalho policial é “imensurável”, em especial, quantificar o quanto o policial “preveniu” de crimes. Quantos crimes evitou durante um patrulhamento? Por isso, os gestores focam tanto em “quantidade de abordagens”, muitas vezes “ilegais”, pois fogem da discricionariedade do agente e deixam a desejar quanto a “fundada suspeita”, mas isso pode ser assunto para outro texto. Focam também na “quantidade de armas” e “drogas apreendidas”, “veículos recuperados” e muitas vezes em “flagrantes” e “prisões realizadas”, verifiquem que coloquei “prisões realizadas” fora da caixinha “flagrantes” justamente para mostrar que a lei prevê que “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por decisão judicial”, mas que existem outros tipos de “prisões” em nosso meio.

O item “Produtividade Policial” no Balanço apresentado pela Secretaria de Segurança Pública e da Paz Social chama a atenção para alguns pontos. A polícia “desacelerou” no último ano, principalmente no último mês e os números referentes ao aumento de crimes torna isso perceptível. As prisões por tráfico de drogas caíram no ano 15,6%, já no mês de setembro caiu 24,4%, as prisões por uso e porte de drogas  caíram 14, 2% e no mês de setembro caiu 28,1% e as prisões de posse/porte de arma de fogo caíram 11,2% no ano e 18,9% no mês de setembro comparados com o ano anterior.

O que isso pode significar? Podemos analisar que os percentuais que estão caindo são apenas referentes ao trabalho da Polícia Civil, já que o combate ao tráfico de drogas é de sua competência,  e a corporação está em greve há algum tempo,  ou que existe também um movimento velado (tartaruga) na PMDF que tem desacelerado o serviço. Este fato só poderá ser confirmado nos próximos três meses, pelo menos. Foi assim das outras vezes. (grifo dado)

Um ponto que pode corroborar com a hipótese levantada acima, que tais percentuais referem-se ao trabalho não executado pela polícia civil, é o fato da localização de veículos furtado ou roubado, trabalho tipicamente da PM, ter aumentado no ano de 2016 em 9,5%  e no mês de setembro do mesmo ano 54,5%. O que pode significar que as operações da PMDF estão surtindo efeito e também que a PMDF está trabalhando bem mais do que trabalhou o ano passado.

Outro ponto que pode ser levado em consideração é que o aumento no percentual de localização de veículos, furtados ou roubados, pode estar diretamente ligado aos 47,7% de aumento no percentual de roubo de veículos, no mesmo período, aliado a um possível aumento no percentual de veículos furtados, que não aparece, mas que deveria aparecer no demonstrativo, pois os dados ficam incompletos para uma análise. Os furtos de veículos são fundamentais para termos uma melhor noção, pelo menos mais próxima da realidade da tal “produtividade policial”.

O bom de trabalhar com números é que eles nos levam para vários caminhos, mas em um ponto os números não metem. Para BITTNER (2003) a atividade policial é muito mais direcionada a quem a pessoa é do que ao que ela faz. O trabalho policial está direcionado pelas próprias forças policiais somente para a apreensão de drogas e armas, além da localização de veículos (grifo dado). O foco policial é o drogado e o traficante que eventualmente rouba ou furta veículos, focam na pessoa e não no que ela faz. Eis a dificuldade em ver além disso! Os policiais são treinados e direcionados, por meio de “políticas públicas” institucionais a perpetuar tais ações.

Por isso, fica difícil reduzir qualquer outro tipo de crime que não esteja voltado para o “aumento da produtividade”. Se um “drogado” eventualmente roubar um transeunte, roubar um veículo, roubar um coletivo, roubar um comércio, furtar uma residência ou cometer um homicídio com certeza ele será localizado, se ele estiver fora destas “características” possivelmente a polícia terá maior dificuldade em identificar o modus operandi do “novo” criminoso (grifo dado. Não é atoa que em entrevistas o discurso da autoridade é sempre voltado para legitimar seu próprio discurso e fortalecer a ligação do crime ao “tráfico” ou ao “uso de drogas”.

Desta forma, o circulo vicioso da segurança pública vai se consolidando. Para BITTNER (2003) os alvos preferidos da preocupação policial são as minorias étnicas e raciais, os pobres que vivem nas favelas urbanas e os jovens em geral (grifo dado). Muitos dos policiais que atuam hoje nas corporações do país são oriundos destas minorias, vieram de camadas pobres da sociedade, muitos moraram ou até moram em favelas atualmente, mas alguns passaram de “oprimidos” a “opressores”.

Para fechar, concluímos nossa reflexão mostrando que a “produtividade policial” diminuiu este ano, mas principalmente este mês e teve reflexo em todos os outros crimes que não estão ligados diretamente a “produtividade policial”. No mês de setembro houve um aumento de 22,7% no número de homicídios no DF, os Crimes Violentos Letais e Intencionais aumentaram 21,3%, o Roubo a Transeunte aumentou 138,8%, o Roubo a veículo aumentou 47,7%, o Roubo a coletivos aumentou 58,9%, os Roubos a comércio aumentaram 54,7%, os Roubos a Residência aumentaram 106,1% e os furtos em veículo aumentaram 272%, totalizando um aumento do número de crimes contra o patrimônio de 129,7%.  E não se pode falar em falência ou fracasso do Pacto pela Vida no DF?

É importante ressaltar, que os números podem ser ainda piores em consequência da subnotificação de ocorrências, tendo em vista a greve da polícia civil que fechou delegacias em horários importantes de ocorrência de crimes (pela manhã e após as 19h, por exemplo). Na cidade Estrutural o posto policial da PCDF foi fechado. A única opção para a população é se deslocar a 8ª DP no SIA, no período da tarde, ou a Central de Flagrantes na 1ª DP, que fica no Plano Piloto. Em uma comunidade carente como a Cidade Estrutural, com sérias dificuldades de transporte público, é pouco provável que as pessoas desloquem-se para fazer tais registros. Talvez seja uma boa forma de se “reduzir” os índices criminais na cidade.

Aderivaldo Cardoso – Especialista em Segurança Pública e Cidadania, pós graduado pelo Departamento de Sociologia da Universidade de Brasília, autor do livro Policiamento Inteligente: Uma análise dos postos comunitários de segurança pública no DF (2011) e ex-assessor especial de gabinete/comunicação da Secretaria de Segurança Pública e da Paz Social (2015/2016).

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Referências Bibliográficas:

BITTNER, Egon – Aspectos do Trabalho Policial/Egon Bittner; tradução Ana Luísa Amêndola Pinheiro. – São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2003. – (Série Polícia e Sociedade, n.8/Organização: Nancy Cardia).

Balanço Criminal do Viva Brasília – Nosso Pacto Pela Vida – Comparativo do Período acumulado de Janeiro a Setembro e o Mês de setembro de 2015/2016. Acessado em 12/10/2016 às 08:05 – http://www.ssp.df.gov.br/images/PASTANOVA/ApresentacoesDeColetivas/balanco.criminal_setembro.2015.2016.pdf

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